Yanubêri, Taumburu e Parauarê

 
 

Egon Schaden em “Mitologia das Tribos Indígenas do Brasil”, conta que segundo a tradição dos índios Mundurucu, o governo da tribo, ligado à guarda e ao uso das flautas sagradas, chamadas “kaduke”, esteve outrora nas mãos das mulheres. Eram elas que habitavam a casa-dos-homens (ekça), e os homens ficavam alojados em uma vasta casa coletiva. E eram os homens que tinham que fazer todo o trabalho, servindo às mulheres: caçavam, cuidavam da roça e até cozinhavam.

 

Esta lenda inicia-se assim:

 

 

Três mulheres, Yanubêri,Taumburu e Parauarê, quando foram buscar lenha à beira de um riacho e ouviram uma música.

 

 Curiosas para descobrirem de onde provinha tão maravilhoso som, aproximaram-se da água, mas só avistaram peixes jejus. Entretanto, três deles foram presenteá-las com as flautas chamadas de “kaduke”. As jovens as experimentaram e passaram a tocá-las escondido, na mata, achando aquele som divino.

 

As três mulheres passaram a se devotar exclusivamente às flautas e abandonaram seus maridos e o serviço doméstico para tocá-las. Os homens ficaram muito desconfiados e Marimarebê, irmão de Yanubêri, as seguiu e descobriu seu segredo, embora não tenha chegado a ver as flautas. Ele contou aos outros homens. Quando as mulheres voltaram, Marimarebê lhes indagou se elas tinham instrumentos musicais na floresta, e elas confirmaram. Então ele lhes disse que elas deveriam tocar os instrumentos em casa e não na floresta. As três mulheres concordaram.

 

Entretanto, como possuidoras das flautas, as mulheres já tinham ganhado ascendência sobre os homens: eles é que apanhavam lenha e buscavam água, e também tinham de fazer beijus.

 

Mas um dia, Marimarebê e Mariburubê, depois de deliberarem com outros homens, resolveram apoderar-se das flautas sagradas, símbolo da autoridade feminina, pois, justificaram, eram eles e não as mulheres que caçavam. Foi-lhes fácil conseguir tal intento, pois eram irmãos menores de Yanubêri, a sacerdotisa-chefe das festas das flautas sagradas. De posse das flautas sagradas, que passaram a ser tabu para o elemento feminino, os homens adquiriram o poder político, passando a ocupar a “ekça”, a construção central e principal da aldeia, em lugar das mulheres.

 

Entretanto, a “sociedade das mulheres”, não foi desfeita, mas perdeu sua importância política e as flautas passaram a ser tabu para mulheres e crianças, já que estas, enquanto não iniciadas e retiradas do convívio das mulheres, poderiam revelar os segredos.

 

Fica claro então, que a Casa dos Homens reflete, portanto, um período de transição, em que o matriarcado, o governo regido pelas mulheres ou ginecocracia existiu e acabou sendo substituído pelo patriarcado.

 

Em resumo, observamos a seguinte relação:

1-     O Poder era antigamente das mulheres.

2-     Os homens revoltaram-se com isto.

3-     Dois herói encabeçam a reação dos homens.

4-     O Poder passou para os homens.

5-     As mulheres ficam relegadas a um estado de inferioridade que reflete uma verdadeira vingança.

Quanto mais estudo e pesquiso sobre os índios, mais me encanto e me surpreendo. Acho que o que ocorre hoje é a falta de informação. Nossos índios não são, nem nunca foram os tolos e ignorantes que os colonizadores pregavam. Muito pelo contrário, pesquisas recentes revelam que eles  possuíram uma organização social muito mais complexa do que se poderia imaginar. Ainda há muito a descobrir, mas não já não há dúvidas de que os índios têm um passado e uma cultura tão grandiosos como os de qualquer outra etnia. Pergunto eu: então porque tanto descaso com o nosso indígena? Estamos acostumados a ver desvalorizado o que é nosso? Talvez esteja faltando um pouco de patriotismo e de amor a terra onde nascemos. Entretanto, sempre há tempo para revertermos este quadro.

 

 

NOSSO ÍNDIO, SÓ QUER SER ÍNDIO. 

 

 

A nós cabe reconhecer que eles não são só remanescentes de um passado distante e sim um povo com direito a ter sua identidade étnica e cultural. Conhecer e ensinar sua história é a única maneira de garantir a sobrevivência desses brasileiros que têm hoje sua última chance sobre a Terra.

 

Rosane Volpatto