A  ARTE DE SE ENFEITAR

Os índios observadores da Natureza, em sua maioria, achavam que o homem é que deveria se enfeitar para despertar o interesse da fêmea. Realmente, a plumagem dos machos das aves é mais rica e elaborada, apresentando também cores mais variadas e brilhantes. O canto do macho ainda, é mais mavioso, mais atraente e envolvente. Este é o motivo, que nos faz acreditar que os índios tomaram estes ensinamentos ao "pé da letra" e sendo assim,em algumas tribos, somente os homens se dedicavam a arte de pintar seu corpo e a se enfeitar com plumagens.

As mulheres podiam, entretanto, ajudar a pintar o corpo de seus maridos. São elas que desde muito cedo enfeitam os filhos do sexo masculino, preparavam os colares, os cintos, teciam as pulseiras e os enfeites de algodão usado nas pernas.

 

DESENHOS ABSTRATOS GEOMÉTRICOS

Apesar da envolvente e grandiosa fauna e flora que os cercavam, os índios pintavam sempre desenhos abstratos geométricos. Era talvez uma simbologia figurada, que partia do natural para transformar-se em ricas significações. Um triângulo de pequena base e grandes lados, segundo eles representava um jacaré. Já um losango no centro e outros dois menores em torno dele representava uma arara.

Nas cerimônias de iniciação dos jovens guerreiros era costume pintarem todo o corpo de preto. Esta cor se integra a idéia de obtenção de força, que é o objetivo da cerimônia.

 

KADIWÉU (PINTURA CORPORAL)

São os Kadiwéu que apresentam uma pintura corporal mais elaborada. Os primeiros registros dessa pintura datam de 1560, pois ela impressionou fortemente o colonizados e os viajantes europeus. Mais tarde foi analisada também por vários estudiosos, entre os quais Lévi‑Strauss, antropólogo francês que esteve entre os índios brasileiros em 1935.

De acordo com Lévi‑Strauss, "as pinturas do rosto conferem, de início, ao indivíduo, sua dignidade de ser humano; elas operam a passagem da natureza à cultura, do animal estúpido ao homem civilizado. Em seguida, diferentes quanto ao estilo e à composição segundo as castas, elas exprimem, numa sociedade complexa, a hierarquia dos status. Elas possuem assim uma função sociológica."

Os desenhos dos Kadiwéu são geométricos, complexos e revelam um equilíbrio e uma beleza que impressionam o observador. Além do corpo, que é o suporte próprio da pintura Kadiwéu, os seus desenhos aparecem também em couros, esteiras e abanos, o que faz com que seus objetos domésticos sejam inconfundíveis.

 

A PINTURA CORPORAL DOS BAKAIRI

Na pintura corporal dos bakairi são utilizadas quatro cores: o preto-azulado do jenipapo, o vermelho do urucum, o preto do carvão e o branco do barro chamado tabatinga.

A cor preta-azulada era usada especificamente para produzir motivos gráficos nos corpos, sempre associados a animais.

O vermelho do urucum é aplicado misturado com óleo de pequi e imediatamente é fixada esta coloração forte na testa e nos pés. As demais partes do corpo, recebe uma solução diluída criando uma coloração avermelhada que tem a finalidade de ressaltar o desenho preto do jenipapo.

O carvão retirado das madeiras queimadas nas fogueiras ou do fundo dos utensílios de barro são usados na maquiagem facial, utilizando-se de uma tala de bunti sem algodão. O traço não é riscado, mas impresso. Existem inúmeros padrões de pinturas faciais e o mais usado é o "kavida enuçaveno", a arara.

No preparo da tinta que se forma através do jenipapo, este deve ser colhido verde, pois desta forma sua polpa é mais rala. Mistura-se então, água a massa polpuda. Em seguida com um pano torce-se bem a mistura até recolher todo o caldo. É colocado em uma panela para aquecer e quando começar a fazer espuma, a tinta está pronta.

O desenho inicia-se delimitando o corpo que deve receber a pintura. Nas mulheres, por exemplo, eram realizadas pinturas nas laterais do corpo, da altura das costelas até o tornozelo.

Os Bakairis vivem em duas áreas indígenas, denominadas Santana e Bakairi, situadas nos municípios de Nobres e Paranatinga.

A ARTE PLUMÁRIA

 

Além da pintura, os indígenas se utilizavam de penas para seus atavios, arrumadas de tal forma que constituía uma verdadeira obra de arte plumária. Nela visualiza-se o seu perfeito senso artístico. Combinavam todas as matizes de cores provenientes do rico colorido de nossas aves tropicais, assim, como algumas vezes, criavam cores novas. Destes, o enfeite mais pomposo era uma espécie de enorme leque, feito de penas de arara, que circundava todo o corpo do guerreiro como uma auréola , deixando aparecer sua silhueta tal qual um ser sobrenatural.

Uma das maiores expressões artísticas do indígena brasileiro são seus trabalhos realizados com penas e plumas retiradas de aves exóticas presentes na nossa ave-fauna tropical. As penas dão forma e cor ao corpo do indígena, que se apresenta então, como um mítico homem-pássaro, uma metamorfose digna de um semi-deus.

 

 

JÓIAS EM PENAS

Os tesouros dos índios eram suas penas e plumas, que devidamente trabalhadas de tal forma que constituíam-se em verdadeiras jóias raras e muito preciosas. Quem possuía muitas destas preciosidades era considerado rico.

A arte plumária revela também, a criatividade e o perfeito senso artístico dos índios. Além disso, enfeitar o corpo era uma espécie de auto-valorização, uma maneira de sobressair-se na tribo. Estes enfeites imponentes davam ainda, grande beleza e majestade aos índios.

Diferentemente dos índios Norte-Americanos, que sempre preferiram o uso de penas de uma só cor, o nosso indígena sempre deu preferência à variedade de tipos e cores de seus enfeites de plumas.

Além dos cocares, faziam uso de pulseiras, colares e mantos. Entre os pássaros preferidos por suas belas plumagens, eram o Acuã, o Gavião-Real, o Mutum e, evidentemente, os Papagaios e as Araras, especialmente apreciados pela variedade de cores e padrões de suas penas.

As diferentes combinações chegavam a constituir como um estandarte para certas tribos, mas, normalmente, cada índio enfeita-se como melhor lhe aprouver, sendo os homens os que mais apreciam esses adornos.

A arte plumária ainda continua sendo a arte indígena mais conhecida e admirada por sua exuberância e riqueza.

 

PLUMÁRIA KAYAPÓS

· A plumária Kayapó é extremamente variada. Possuem cocares, testeiras, diademas, braçadeiras, pulseiras, bandoleiras, ornamentos, dorsais e flechas.

· Existe uma variedade de ornamentos dentro de um mesmo grupo Kayapó. Os ornamentos variam em forma e tamanho, tornando possível a identificação dos diferentes subgrupos (escala social).

"...apesar de possuírem uma tradição artística comum, cada grupo evoluiu ao longo de orientações estéticas próprias sendo que a criatividade de um artesão anônimo levou a novas expressões artísticas." (VIDAL in "Arte plumária do Brasil", p. 32)

A plumária kayapó é usada nos rituais de iniciação masculina e nominação, no casamento e na paramentação dos mortos nos rituais funerários.

· A ornamentação plumária se relaciona com a vida cerimonial dos kayapós, enquanto no cotidiano o que prevalece como ornamentação do corpo são as pinturas.

· Os ornamentos possuem grande simbolismo para os kayapós. Por exemplo: para um sub-grupo kayapó (kayapó-xikrim) os objetos de plumária podem representar um olho, sendo as penas utilizadas em pestanas. Ou o sol, onde as penas representam os raios.

No Brasil, ainda existem pelo menos 30 grupos indígenas que produzem adornos plumários. Alguns deles: Xavante, Waurá, Juruna, Kaiapó, Tukano, Urubus-Kaapor, Asurini, Karajá.

 

A VAIDADE DOS KARAJÁS

Os karajás faziam da pintura o seu vestuário. Seus corpos eram pintados de branco, vermelho e preto. O branco vem da argila, o vermelho do urucu e o preto do jenipapo ou fuligem de madeiras queimadas. O cacique e suas mulheres, recebiam tatuagens e pinturas diferentes no rosto, um risco em forma de leque entre os lábios e o queixo.

As tatuagens eram feitas com dentes de cachorro, encastoados numa cuia, que riscava cortando lentamente a pele. Logo que o sangue dos cortes estancavam, inseriam a tinta do jenipapo. Depois da cicatrização apareciam os desenhos realizados. Esta técnica não é mais usada.

 

Além das pinturas há outros adornos, como uma resina que colam no corpo flocos de algodão nos braços e nas pernas. No pescoço ostentavam um colar de miçangas divinamente trabalhado. Na cintura usam, um cinto de algodão trançado, que formam desenhos arabescos, desenhos marajoras, enriquecidos com franjas de penas, nas cores do arco-íris. As pernas e os pulsos, eram adornados pelos "tamancuras", enfeites de algodão trançado.

Eram costume entre os karajás abrirem um orifício nas orelhas das crianças já ao nascer. Introduziam nele dentes de capivara, plumas pendentes de penas de papagaio ou uma simples vareta. Os homens ao atingirem a idade de 6 a 7 anos, abriam um orifício no lábio inferior e nele colocavam pedaços de ossos, pedras, madeiras ou conchas. Os jovens disponíveis usavam enfeites de algodão tingidos, nos braços e nas pernas, quadris e nucas. As cores iam desde o vermelho para os jovens, até o preto para as crianças.

 Os homens também usavam um cordel na cintura, que servia de estojo peniano: o "natecaná". Desde pequenos usavam esta peça. Ao chegar a adolescência, os jovens usam o "etu", cordel de cintura feito de dois fios de algodão bem trançados e tingidos de vermelho.

Em algumas tribos só os homens usavam atavios, mas entre os karajás ambos os sexos deles se utilizavam.

Nos encontros festivos, os karajás, usavam na cabeça, o tão conhecido cocar, marca registrada do nosso índio. O cocar é confeccionado partindo de uma armação de taquara, onde são dispostas graciosamente penas de papagaio, araras, cegonhas, garças e outras aves. Algumas podem ser pintadas artificialmente, o que não reduz seu encanto. A roda de plumas são feitas com longas penas enfiadas em séries de cordéis, em curva, que repousarão na cabeça.

 

ENFEITES DOS ÍNDIOS UAURÁ (WAURÁ)

Os Uaurá vivem perto do rio Batovi e é uma tribo em franca extinção. A sua arte plumária os destacavam entre muitas tribos. Os homens usavam uma pena vermelha que vai da orelha ao nariz que são perfurados. Confeccionam também, dois tipos de cocar. Um suntuoso, feito numa espécie de diadema e é coberto com penas pretas, vermelhas e amarelas. Partindo deste anel, saem penas grandes de araras nos tons: amarelo, vermelho e azul que formam um leque. No centro do cocar colocam duas penas compridas do rabo da arara.

O outro tipo de cocar é bem mais simples. Se constitui de uma faixa onde são fixadas as plumagens e amarradas posteriormente à cabeça. Usam também braceletes de plumagens amarela de penas do papo do tucano, presos na parte superior dos braços.

OS ENFEITES DOS TIRIIÓS

Na região onde moram os Tiriió existem os mais belos espécimes de pássaros da América do Sul. Os cocares por eles utilizados são muito ricos e chamados de "tixamaxama". O mais elaborado é usado somente em dias de festa e é confeccionado a partir de penas de tucanos. Nos dias comuns ornamentavam o braço com uma enorme pena de arara-piranga (vermelha) e pintavam o corpo com tinta preta.

Todos se enfeitam, até mesmo as crianças. Os homens adultos ornamentam-se mais que as mulheres. Usam colares de miçangas no pescoço, no braço e na cintura. As mulheres furam o septo nasal e enfeitam-no com um pauzinho. Homens e mulheres usam uma espécie de tanga de algodão bem colorida.

 

ADORNOS FEMININOS          

As intervenções corporais femininas eram conseguidas através de escarificadores com espinhos; tesouras de mandíbulas de piranha eram utilizadas para o corte de cabelo; instrumentos furadores de lábios para o uso do tembetás e para orelhas que eram adornadas com elaborados brincos de penas. Fazem também parte o universo feminino as tiras de látex que atadas nos tornozelos ou na barriga da perna, davam sensuais contornos a esta região do corpo.

Os discos labiais e ouriculares, fazem parte do universo masculino e apontam para a importância da fala e da audição direcionados para os homens mais velhos ou chefes da aldeia. Os tembetás também eram usados pelos homens simbolizando a passagem para a vida adulta.

Os arranjos de cabelos femininos eram feitos de acordo com a idade. As meninas usavam franja até a nuca. As mulheres usavam o cabelo para trás e comprido.

Para o indígena, o corpo é a ligação física entre a alma e o mundo exterior. O corpo é também, o meio pelo qual o homem se projeta na sociedade. O seu uso e o modo de como ele é apresentado, nos informa traços precisos da comunidade onde ele se encontra inserido, o seu grau de integração e o controle que ela exerce sobre o interior deste mesmo homem.

Texto pesquisado e desenvolvido por
 
Rosane Volpatto
01- Arara
02- Araweté
03- Ashaninka
04- Asurini
05- Bororo
06- Enawenê Nauê
07- Guarani
08- Juruna/Yudja
09- Kaapor
10- Kayapó
11- Kalapalo
12- Karajá
13- Kaxinawá
14- Krahô
15- Maioruna
 
16- Marubo
17- Matis
18- Matipu
19- Mehinako
20- Rikbaktsa
21- Suruí
22- Tembé
23- Ticuna
24- Tirió
25- Waiana Apalaí
26- Waurá
27- Wai Wai
28- Waiãpi
29-Yecuana/Maiongong
 

BIBLIOGRAFIA:

ARTE PLUMÁRIA NO BRASIL, 1980, Brasília: Fundação Pró-Memória, 1980.
78p. ( Catálogo de Exposição).

CULTURAS INDÍGENAS DO BRASIL - Aurélio M. G. de Abreu.

BRASIL, HISTÓRIAS COSTUMES E LENDAS - Alceu Maynard Araújo. Editora Três.

 

 

 

 

 

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