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ARUANÃ, LENDA E RITUAL DE DANÇA
Aruanã, filho de Aruá e
primo dos Lendários Arumanás, vivia solitário e triste dentro das fundas águas
do imenso Araguai.
Ele era um eterno enamorado
da vida terrestre, particularmente da vida do homem.
Um dia, a poderosa
Jururá-Açú, deusa das chuvas, do orvalho e irmã de Iara, impelida por sagrado
desejo, chamou em meio das águas, os angás, os arumaçás e seus filhos, para irem
honrar o poderoso Boto, senhor das águas, na funda Loca onde habitava o deus
marinho. Todos os seres das águas do volumoso e imenso Araguaia, correram para o
fundo do rio, a fim de erguerem suaves preces entre cantos e louvores. Somente Aruanã não conseguiu com a turba e exclamou:
-"Pobre de mim, nas águas
nasci, nas águas me criei, contudo já não tenho felicidade!"
Assim falou o valente Aruanã
e colocando a cabeça fora da água, continuou:
-"Ó pai Tupã, se a ti
próprio te apraz, a felicidade de um pobre mortal, se propício a mim, faze-me um
ser humano e, se algum dia eu tenho que morrer, não me deixe nestas águas,
tira-me delas.
Tanto suplicou Aruanã que
sua prece acabou sendo ouvida. No aprazível e sagrado monte Ibiapaba, Tupã
observou com seus olhos divinos e compadecidos o que estava se passando nas
margens do rio Araguaia.
-"Vai tu Polo e satisfaz os
desejos de Aruanã."
Obedecendo as ordens do
supremo, o deus do vento, aproximou-se do local onde estava o formoso peixe e
tomando-o levou-o para o verde campo.
-"És tu, um valente
guerreiro, Tupã mais do que dele esperavas!"
Assim disse Polo, o deus dos
ventos e desapareceu.
Ó maravilha! Ali estava um
homem! Então vieram, por ordem do criador, as belas e divinas Parajás deusas da
honra, do bem e da justiça e assim falaram:
-"Aruanã, peixe foste tu;
Aruanãs hás de chamar-te daqui para o futuro."
E, foi deste modo que
nasceram os valentes Aruanãs e habitaram as margens do lendário rio Juruá. Eram
uma tribo poderosa, laboriosa, resistente e reconhecida.
Deles vieram mais tarde os
Aruaques, que foram habitar nas Antilhas, os Aruãs que ficaram na ilha de
marajó; os Arucuinas, que habitaram nas fronteiras do Brasil com a lendária
Guiana Francesa; os Arumás, que foram viver nos altos do rio Parú, os
conservadores e canoros Karajás, que foram habitar as margens do Araguaia, onde
todos os anos organizam o sagrado Ritual do Aruanã, com suaves danças e divinos
cantos, em homenagem ao inesquecível Aruanã, pai da nação Karajá.
O mundo Karajá é habitado
por um grande número de personagens mais ou menos fantásticos, os aõni e outros
seres que os Karajá distinguem como habitantes do céu (biuludu) da terra (suuludu) e da água (beeludu). Grande parte desses seres,
principalmente os celestes, semelhantes aos pássaros que voam ou diversos Ijasó,
são “pessoal” do Xiburè, imahãdu, ou “criação dele”, ou seja, são seres animados por Xiburé. São formas diferentes que Xiburè
assume; mas todas elas são Xiburè.
Grande parte ou a totalidade dos
animais valorizados pelos Karajá e que existem aqui na terra são pertencentes,
ou parte dos ijasò que vivem nas
profundezas.

RITUAL DO ARUANÃ

Os Karajá vivem no Brasil
central, nas margens do rio Araguaia, o Berohokã - que significa a água grande,
e é neste rio que está a sua mais importante fonte de subsistência. A vida
cultural dos Karajá está também estreitamente ligada ao Berohokã. Os
acontecimentos do cotidiano, assim como o período de plantação, colheita e caça,
como também as festas e os rituais sagrados, acompanham os períodos das estações
de chuva e seca, isto é, da vazante e das cheias do rio Araguaia. Em princípio,
as datas dos eventos são marcadas pelo Xamã, pois os índios dizem que só ele é
capaz de enxergar e entender as mensagens dos seres sobrenaturais, seus
ancestrais que vivem no fundo do rio.

A estrutura ritual dos Karajá tem dois
grandes rituais como referências: o rito de iniciação masculina, o
Hetohoky, e a Festa de Aruanã, que apresentam ciclos anuais, baseando-se
na subida e descida do rio Araguaia.
  
Durante a encenação do ritual de dança,
os Aruanã transmitem, cantando, as mensagens dos seres sobrenaturais que vivem
debaixo da água do rio Araguaia. Os dançarinos ficam praticamente
imperceptíveis; vestem-se de palha de buriti, cobrindo a cabeça até abaixo dos
joelhos, mas se mantêm com os braços de fora. As palhas são colocadas formando
dois grandes saiotes. Um deles, amarrado na cintura e o outro, preso em cima da
cabeça. Na parte superior da cabeça é montado um adereço no formato de cartucho
cilíndrico completando-se com penachos. Esses cilindros são decorados com
desenhos simétricos coloridos que inicialmente eram feitos de plumagem, mas hoje
são realizados com pedaços de pano ou papel grosso colorido. As máscaras também
fazem parte das vestimentas. Este assunto é envolvido em mistérios, cujas
informações os índios passam com muitas reservas.

As dançarinas usam uma tanga feita da
entrecasca da madeira de adehyre, e enrolam nos braços, tornozelos e joelhos
enfeites confeccionados de algodão tingido de urucu. O enfeite dos joelhos é um
pouco mais largo e tem alguns fios pendurados. No rosto e algumas áreas bem
definidas do corpo desenham motivos geométricos, sendo que as mais jovens se
adornam com colares confeccionados com miçanga coloridas.

ENCENAÇÃO
Os Aruanã começam o Ritual
de Dança saindo da Casa dos Homens. Depois passam a cantar e dançar cada música
durante três voltas, percorrendo a estrada entre o pátio masculino e o feminino.
Na segunda volta duas dançarinas saem andando do pátio feminino, indo se
encontrar com os Aruanã no meio da estrada. Colocam-se à sua frente e, juntos,
dançando, retornam ao pátio feminino. Na última volta, isto é, na terceira, os
Aruanã param de cantar quando atingem o pátio feminino, e em total silêncio
retornam, sem dançar, ao espaço masculino, para então recomeçar a dança com
outra música. Considerando também os conteúdos símbólicos e culturais dos Karajá
foi possível chegar à imagem do princípio, isto é, à estrutura da coreografia da
dança, como uma representação simbólica do universo Karajá: os três mundos, o do
fundo das águas, onde vivem os Aruanã, o do meio, onde vivem os humanos Karajá e
o mundo do céu.

Os cantos apresentam sempre
dois temas, que os Karajá chamam de primeira e segunda música. À primeira,
denominam "Iumy", (corpo), e à segunda, "Ito ou Iòwòna", (subida). Cantam
primeiro três vezes o tema A, depois o tema B uma, duas ou três vezes, isto sem
sair do espaço masculino. Quando começam a dançar pela estrada retornam ao tema
A, cantando até alcançar o meio da estrada. Aí então voltam a cantar o tema B,
que também podem cantar uma, duas, ou três vezes, conforme a disposição da
permanência neste espaço. Ao retornarem à dança prosseguem pela estrada, com o
tema A, que vão cantando até atingir o pátio feminino, onde passam a cantar o
tema B. E assim sucessivamente, até completarem três voltas, que fazem durante
todo o percurso de cada música. Porém, na última volta, ainda no espaço
feminino, depois de cantarem o tema B com suas devidas repetições retornam
sempre ao tema A para finalizar. Assim sendo, de uma certa maneira o tema A está
associado ao gênero masculino, assim como o tema B ao feminino.

Como se vê, esta representação
estética obedece a uma ordenação, e expõe características que priorizam certos
elementos simétricos enfatizados por tríades. Esses elementos configuram a
seguinte forma:
A 3
vezes (No espaço masculino) B 1,2,ou 3 vezes (Ainda no espaço masculino) A
Sucessivamente (Na estrada) B 1,2,ou 3 vezes (No meio da estrada) A
Sucessivamente (Na estrada) B 1,2,ou 3 vezes (No espaço feminino) A 3
vezes (No espaço feminino, cantam para retornar à estrada, ou para
finalizar).

A IMPORTÂNCIA DO MITO PARA O POVO
INDÍGENA:
Segundo Samuel Yriwana
Karajá:
“O mito é quando agente está próximo da
nossa origem. Quando a gente conhece o nosso mito de origem agente se aproxima
da nossa origem. O mito é importante nesse momento que agente está vivendo para
a gente não perder a nossa origem porque sem ele agente perderia
totalmente a nossa origem. O mito conta a história do nosso povo. Essa
explicações nós não encontramos em nenhum outro lugar, é só no mito que
encontramos essa explicações. Para nós Karajá, os nossos mitos têm força espiritual, porque no mito
encontramos a história do povo Karajá, a história de outros povos, a história dos animais, a
história das plantas. Para os Karajá, o mito é uma coisa viva, porque ele conta
a história do povo. O mito é muito importante na comunidade porque ele é contado
e os Karajá considera como uma realidade porque ele foi contado antigamente.
Então a raiz do índio está no mito e se agente não guardar o que vai valer é a
lei do branco. As mulheres também contam os mitos e as histórias ".

Concluimos que para os Karajá, o mito
é fundamental importância, porque ele conta a história do povo, conta a
história de outros povos, dos animais, das plantas. Além disso, o mitos tem
força espiritual. É através do mito e da celebração de rituais que os Karajá
lutam para preservar e revitalizar sua história, sua língua, enfim, suas
tradições culturais.

"Olhem as árvores
acompanhando o movimento da tempestade, elas preservam seus ramos tenros. Se
quiserem erguer-se contra o vento, são carregadas, com raiz e
tudo."

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