"....e
o nosso gado estava ali, pastando
na
erva fresca, quando as mulheres o atacavam com suas mãos nuas.
Terias
visto uma das mulheres pegar uma vaquinha que mugia,
de
úberes cheios, para levantá-la pelas patas traseiras
com
seus dois braços abertos.
Outras
pegavam nossas vacas e
as
dilaceravam de uma extremidade a outra.
Terias
visto algumas costelas, ou uma pata saltar pelo ar
e
pedaços de carne pendurados
nos
ramos dos pinheiros pingando sangue."
(Eurípedes,
1954, 217)
Na
Antiga Grécia, no culto à Dionísio, deus da loucura e da tragédia,
existiram rituais de esquartejamento de animais, que nada mais era do
que a representação do desmembramento do menino Dionísio pelos titãs:
"Com
Perséfone, a rainha do mundo subterrâneo, Zeus teve um filho, Dionísio-Zagreu.
O pai tinha a intenção de que o menino dominasse o mundo, mas os titãs
o seduziram com brincadeiras para esquartejá-lo e devorar seus membros.
Atena, no entanto, resgatou seu coração e o levou a Zeus, que o comeu.
De Zeus, nasceu, então, um novo Dionísio, o filho de Sêmele. Zeus
abateu is titãs com seu raio vingador e os reduziu a cinzas. Destas
cinzas foi formado o homem e, por isso contém em si mesmo uma parte
divina proveniente de Dionísio e uma parte oposta, proveniente de seus
inimigos, os titãs" (Ibid.,217)
O
menino Dioniso sendo dilacerado e devorado pelos titãs pode ser visto
como um modelo mítico de iniciação a que está sujeito o ser humano e
a qual deve sofrer em seus primeiros anos de vida.
Rituais
de canibalismo, sacrifícios e matanças se formaram na aurora da história
e se atribui suas origens à culpa primitiva.
Esse
ritual de culto à Dionísio foi evoluindo, passando mais tarde a ser
uma arte e não um culto: a tauromaquia, a difícil e perigosa arte de
correr touros na praça, na arena a tourada. No final do século XII ou
início do XII, em Portugal, já podiam ser vistas as touradas já tão
popularizadas na região ibérica. Na há português do sul que não
conheça esta modalidade primitiva de festa brava, em que o riso
prepondera sobre a emoção e a arte de lidar com o touro cede o passo
à cambalhotas e às peripécias da fuga e da arremetida intermitentes.
Em
Santa Catarina o boi-na-vara ainda é praticado, mas por muito poucos.
É uma espécie de tourada realizada pelos catarinenses. Nada mais é,
do que a sobrevivência dos rituais das "Bacantes", trazida
para o Brasil pelos açorianos. Revivem, em parte e, talvez sem saber, o
antigo ritual grego. E, se processa da seguinte forma:
Uma
vareta de bambu forte e grossa, mas flexível, tendo de seis a sete
metros de comprimento que é enterrada a quase um metro pela extremidade
mais larga, para fixá-la ao solo. Na outra extremidade pende um laço
bem atado que deve prender-se às guampas de um boi ou touro escolhido,
como capaz de luta. Mais ou menos a 2/3 da vareta é preso uma figura de
homem em tamanho natural, feita de trapos e panos. Quando o boi estica o
laço, tentando desprender-se, a vara curva-se e o boneco como que fica
suspenso e ameaçador sobre sua cabeça. O boi ao vê-lo, arremete
contra ele e a vara volta à posição vertical, levando consigo o
boneco. Aquele recua de novo, este torna ainda à segunda posição. E
as cenas se repetem enfurecendo o boi, a ponto de as vezes, rebentar as
prisões, atirar-se em todas as direções e investir contra o povo que
o assiste.
Este
folguedo se realiza até o completo esgotamento do animal,
quando então, matam-no e repartem a sua carne entre os
participantes da "brincadeira". |
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O
interessante é que este festejo é realizado na Semana Santa, no Sábado
de Aleluia.
Aqueles
que na Semana Santa se abstêm de carne de vaca fazem neste dia um
ruidoso banquete com a carne do boi.
O
boi-na-vara também é conhecido por: boi-na-corda, boi-no-campo,
boi-do-mato
O
boi-na-vara, está praticamente extinto, mas deu lugar à farra-do-boi,
onde diferentemente da primeira, o boi fica solto, posto em liberdade
pelos farristas que passam a excitá-lo em campo aberto ou em mangueirões
(áreas cercadas). O boi perseguido e acuado é malhado e sendo presa fácil
é sacrificado pelos patrocinadores do boi. Outra diferença marcante
entre as duas manifestações é a postura dos farristas. Onde antes
participavam mais passivamente, somente cansando o animal; atualmente,
passam a ter uma participação mais ativa, enfrentando o animal,
maltratando-o até a sua morte.
Herança da cultura açoriana, a farra do boi vem sendo praticada há,
pelo menos 230 anos.
As
tentativas de proibição não são de hoje. Em 1567, a prática
na Ilha Terceira, em Açores, foi proibida formalmente pelo Papa Pio V,
sob alegação de “feitiçaria dionisíaca”. No século passado, em
Santa Catarina, a alegação das autoridades se referia ao “alvoroço”
nas ruas, ou à formação de “ajuntamentos ilícitos”,
“desordem” e “arruaça”.
No final de 2000, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina acatou
iniciativa do governo do Estado, que pediu a proibição da farra do boi
em Santa Catarina, em contrariedade à lei aprovada pela Assembléia
Legislativa que autorizava a farra em locais fechados.
Com
isso, a “brincadeira” está proibida, não podendo ser praticada em
ruas ou arenas. Mas mesmo com a proibição, a farra do boi parece estar
longe do fim.
Hoje
em dia realizamos um elogiável esforço para nos conectarmos imagináriamente
com nossas origens. Os estudos sobre a evolução e a pré-história,
graças a ajuda de novos recursos científicos, inimagináveis uns
tantos anos atrás, têm muito o que dizer a respeito de nossa biologia
e sua relação com nossas complexidades psíquicas e de conduta. Mas
acho, que a assimilação de tais conhecimentos não dá o direito ao
homem de hoje, de se comportar como um titã desacorrentado e dominado
pela selvageria, comportamento este, que corresponde à de um homem
primitivo.....
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Lei
Federal nº 9.605, de Fevereiro de 1998 : Dispõe sobre as sanções
penais e administrativas derivadas de condutas e atividades
lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências.
Capítulo V - Dos Crimes Contra o Meio Ambiente
Seção I - Dos Crimes Contra a Fauna
Art. 32: Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar
animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exótico.
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Texto
pesquisado e desenvolvido por
ROSANE VOLPATTO
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