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AVINHOCÁ: A ORIGEM DO ARCO
Avinhocá resolveu, às margens do rio Kuluene,
acima da foz do Turuine (rio Sete de Setembro),
reuniu índios de todas as tribos, mansos, bravos,
para distribuir instrumentos de defesa.
O primeiro a
aparecer foi o Kuikúru que tomou o arco branco.
Daí em diante os Kuikúru e todos os seus parentes
usam arco desse tipo.
Depois apareceu
outro índio, que pegou o arco de madeira escura.
Finalmente apareceu outro, que pegou o arma de
fogo.
Feito isso,
Avinhocá mostrou uma pequena lagoa e mandou todos
se banharem ali. Como a lagoa tinha muita piranha,
jacaré, cobras, etc., os índios ficaram com medo,
o que fez Avinhocá ficar zangado. Os índios,
então, molharam só as mãos e correram para
enxugá-las num tronco de árvore. Essa árvore ficou
com a casca branca e foi denominada de
pau-de-leite. Mas, um menos medroso obedeceu a
Avinhocá e se atirou na lagoa, por isso ficou
branco. Esse é o civilizado que pegou a arma de
fogo. Nesse instante uma árvore gritou lá de
dentro da mata e os índios responderam. Avinhocá
predisse:
-"As árvores
morrerão um dia e os índios também desaparecerão".
Novo grito foi
ouvido, desta vez vindo de uma pedra. O civilizado
respondeu o grito e daí Avinhocá disse:
-"A pedra nunca
morrerá e, portanto, os caraíbas nunca
desaparecerão".
Depois disso
tudo, Avinhocá determinou que todos fossem embora,
cada um para um lado. Avinhocá ainda estava ali
quando chegaram seus filhos, Tivári e Torrôngo.
Nesse momento apareceu Rit-Taurinha. Deu óleo de
pequi a um dos filhos de Avinhocá e mandou que
passasse no corpo. Avinhocá não deixou, dizendo
que aquele óleo envelhecia. Para provar, passou o
óleo no seu próprio corpo, ficando bem velho. Em
seguida, Rit-Taurinha deu um pedaço de fumo ao
outro filho de Avinhocá mandando que ele fumasse.
Avinhocá interveio outra vez dizendo que o fumo é
somente para os velhos. Moço fumando envelhece
depressa. Por isso é que só índio velho é que
fuma. Rit-Taurinha partiu deixando Avinhocá e os
filhos. Um deles, Tivári, resolveu casar e partiu
para beira do rio. Chegando lá, disse que seria
sua mulher aquela que o acompanhasse. Dizendo
isso, mergulhou nas águas. Todas ficaram com medo,
até as capivaras fugiram do lugar. A andorinha
porém, imprevidente, continuou esvoaçando por
sobre as águas e, numa das vezes em que se chocava
com a superfície, foi apanhada por Tivári, que a
levou para sua aldeia no fundo do rio. Todos
acreditam que lá no fundo do rio há uma grande
aldeia com bonitas roças.

Essa é uma bonita
lenda que faz referências a origem dos diversos
tipos de arcos em diferentes tribos, assim como
também faz um alerta sofre a feroz perseguição que
sofriam os indígenas pelo homem branco.
Entretanto, não
era só a arma do homem branco que exterminava o
índio, pois mal ele chegava, aos núcleos dos
civilizados, para obter utensílios ou amas, a
fortaleza de seu perfeito organismo, abria-se a
todo tipo de doenças, que acabou devastando
gerações inteiras.
O menor contato
que o nosso índio tinha com os estrangeiros,
apanhava gripes mortais e sucumbia rapidamente,
transmitindo o vírus para os demais indivíduos de
sua tribo.
Quanto a alegação
de Avinhocá de que as árvores iriam desaparecer
assim como o indio, era porque a floresta já
estava sendo derrubada para construção de gaiolas,
casas, estradas, pontes, devido a agitação febril
da população estrangeira que se estabelecia na
região.
O sábio Avinhocá, sem
ilusão de seu destino com a chegada do homem
branco, ainda assim, estava determinado a
permanecer até o fim de seus dias e nesse tempo,
deveria repassar toda sua sabedoria aos membros
mais jovens. Sendo assim, orientava-os sobre o mal
que causa o óleo pequi e o fumo. Vê-se, inclusive,
que Avinhocá já tinha conhecimento dos malefícios
do hábito do fumo, pois admite que esse só deveria
ser consumido pelos velhos.

O que devemos ter
em mente hoje é, que não existe, nem nunca
existiu, povos superiores e povos inferiores,
conforme determinavam os primeiros colonizadores
dessa terra. A diferença tecnológica entre as
culturas não revela nada que a respectiva cultura
possa gerar. Uma tribo indígena da Amazônia, que
vive sem televisão, sem automóveis ou aviões, não
tem uma cultura inferior àquela que vive nas
grandes cidades, onde a fome a a fartura dividem
pobres e ricos de uma mesma rua.
Do mesmo modo,
não podemos falar de povos "mais cultos" que os
outros, pois a cultura é algo muito mais amplo que
inclui a produção material, social e cultural.
Portanto, todos os povos têm cultura e todas as
pessoas são cultas. É a cultura que nos distingue
do reino dos animais e da natureza orgânica e
inorgânica.
É através da
cultura e de sua história que um povo constrói sua
identidade e sua alteridade.
Infelizmente, a
"intervenção estrangeira" junto aos povos
indígenas continua até hoje. A comunidade nacional
contemporânea ainda não conseguiu aprender a
respeitar o ser diferente: a alteralidade dos
povos indígenas.
Texto pesquisado
e desenvolvido por
ROSANE VOLPATTO
Bibliografia:
Xingu, Os índios
e seus Mitos - Orlando e Cláudio Villas Boas

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