ARTE RUPESTRE

 

 

"Aqueles que desconhecem seu passado, estão condenados a repeti-lo"  (Goethe)

 

 

 

As mãos manchadas de sangue deixam uma silhueta estampada na parede da caverna, o homem pré-histórico a percebe e isso passa a se constituir a descoberta mais sensacional. Será através das mãos, instrumento de preensão técnica, que ele reproduzirá suas experiências, manifestando-se conscientemente através da arte.

 

 

 

As silhuetas das mãos, assim como dos pés, são encontradas entre as manifestações artísticas mais primitivas do mundo.

 

Descobrindo o homem que sabia desenhar, encheu as paredes de sua caverna com pinturas. Neste período, tais desenhos ensaiam os primeiros passos e ainda não são arte no sentido pleno, porque não possuem substância, não mobilizam em sua plenitude, os efeitos da linha e da cor. Este primeiro ser que feriu a tranqüilidade da pedra, para dar um risco explicativo e intencional, estava no período infantil. Este indivíduo primitivo, cuja mentalidade o índio encontrado no Brasil conservava, ainda era presa do primeiro choque, do primeiro espanto diante da multiplicidade da vida. Por isso, gisava, riscava e gravava coisas simples a que chamamos de inscrições lapidares, inscrições petrográficas ou desenhos rupestres.

 

 

Esta arte rudimentar já foi encontrada em todos os lugares da terra. E, os motivos dos desenhos, são geralmente idênticos: linhas verticais, paralelas e transversais; círculos, círculos concêntricos, espirais, o pé humano, a figura humana e animais. Estes desenhos rupestres formam um patrimônio comum, sem nenhuma interdependência, como criação espontânea e intuitiva. Sabe-se que produtos de intercorrência, não implicam necessariamente relações ou contato culturais.

 

 

De início, alguns estudiosos acreditavam que as cavernas pintadas constituíssem a vivenda dos homens primitivos, com seus adornos e sua decoração. Entretanto, com o tempo, descobriu-se que as galerias, contendo pinturas, constituíam na realidade santuários, centros rituais e iniciáticos. A arte foi então, um instrumental que tornou possível a concretização do mundo mítico e a exposição de seus conceitos mágico-religiosos. As pinturas faziam parte de um ritual que se completava com mímica, danças e relatos de lendas. Através destes rituais, que o homem procurava curar as doenças, eliminar os inimigos, apaziguar os deuses e provocar ou acalmar a natureza.

Concluindo, a arte e a magia andavam de mãos dadas, indissolutas.

 

 

O homem primitivo, de pensar mágico, incapaz de conceituar, definir ou propor analogias, indistingue realidade de aparência, ser e imagem. Quando retratava o animal ferido pela azagaia do caçador, acreditava ter ferido, verdadeiramente, o animal de que dependia para sua sobrevivência. Da mesma forma, acreditava interferir realmente no processo da fertilidade dos rebanhos, quando representava um casal no ato da cópula.

 

Diante das pinturas nas cavernas-santuários, o ritual era realizado nas vésperas das caçadas, com danças e invocações. O feiticeiro se revestia de máscara-animais, executando estranhos trejeitos e passos, cercado pelos caçadores, que dançavam à sua volta.

 

 

 

O estudo sobre a escrita dos habitantes do Brasil pré-cabralino é um dos mais apaixonantes temas da arqueologia em virtude de inúmeros trabalhos existentes sobre o assunto, divididos entre aqueles que acreditam e os consideram absurdo dar sua autoria aos indígenas aqui encontrados.

 

As inscrições encontradas em cavernas e rochedos situados em diversos pontos do território brasileiro, contam-se aos milhares e têm propiciado o aparecimento de fantásticas teorias, sendo tais gravações serem atribuídas a fenícios, gregos, vikings, etc.

 

Os índios do Brasil quebravam os raminhos do caminho, primeiro para conseguir passagem, depois, para marcar o itinerário. Orientavam-se também pelas pegadas antigas, passando depois a imprimi-las intencionalmente. A figura do  pé, portanto, é o resultado desse processo evolutivo. O progresso que medeia entre a marca aplicada na árvore e a representação da pegada, corresponde à diferença entre o entalhe e o contorno, o sinal e o desenho. É um passo dado por intermédio do gesto, que também explica e comunica, por meio de contornos.

E o gesto que era, anteriormente, apenas executado no ar, fácil de perder-se, suscetível de não ser usado vantajosamente, passa a constituir uma "utilidade", pois torna-se um meio de comunicação, desde que fosse fixado, por exemplo, na areia, numa figura visível e duradoura.

 

 

Mas esses traços e desenhos, essas inscrições lapidares e petrográficas, refletem apenas uma forma ideológica muito rudimentar. A sua marcha vai operar-se devagar, ela só se desenvolverá muito mais tarde, com pleno desenvolvimento de outras funções do ser.

 

 

 

Segundo Karl von den Steinen, a interpretação misteriosa dessas escritas figuradas deu origem a uma infinidade de disparates. Há quem diga que esta arte é um símbolo de perpetuação ociosa do nosso indígena. E há ainda, os que ficaram no meio do caminho, sobre o significado ou não que esses sinais rupestres ou inscrições lapidares pudessem ter.

 

Mas, as inscrições lapidares dos índios do Brasil são isso mesmo: Inscrições dos Indígenas!

 

Em outras palavras, nos lugares onde apareciam as inscrições, tinham vivido índios, demorado por estações, caçado, pescado, vivendo em plena natureza, que envolvia a vida sexual, as atrações de sentimentos e a própria morte. E, por viver nestes rincões, teve necessidade de comunicar-se e o seu desenho, era uma das formas de comunicabilidade, é a arte primária sendo colocada à serviço das primeiras necessidades de um grupo.

 

 

 

Teodoro Sampaio, tomou em consideração essa tese de que, nos lugares onde apareciam as inscrições, tinha-se estabelecido centros de cooperação humana, grandes núcleos de vida, muito antes das cavernas tornarem-se lugares de enterramentos. Ao local do cemitério, procedera um centro coordenador de vida.

 

As inscrições, que parecem simbólicas, porque se apresentam em sítios funerários, são sinais de comunicação, uma escrita desenhada, produzida dos seres vivos. E tão vivos e inspirados estavam que motivos do reino animal predominavam nessa arte. O mundo animal dominava o mundo deste indígena, talvez em virtude de sua vida de caçador.

 

Tristão de Alencar Araripe, publicou um extenso trabalho na "Revista do Instituto Histórico", que figura como fonte de consulta até os dias atuais. Entretanto, ele não chegou a emitir um juízo acerca dos possíveis autores daquelas inscrições.

 

 

Já Bernardo Azevedo da Silva Ramos acreditava que a maior parte das inscrições lapidares eram gregas ou fenícias e compilou um monumental trabalho em dois volumes "Inscrições e Tradições da América Pré-Colombiana" em função de tal idéia.

 

No ano de 1895, surgiu um livro do famoso explorador americano Carlos Frederic Hartz, lançado em tradução brasileira com o título de "Inscrições em Rochedos do Brasil". Suas conclusões não lhe permitiram emitir um parecer definitivo, mas a a obra é de grande importância por conter sinais de sítios que já não existem.

 

O etnólogo alemão Theodor Koch-Grünberg, depois de realizar uma expedição pelo o rio Negro, declarou, em sua obra, que data de 1907, que os grafismos que encontrou, eram resultado, única e exclusivamente, do ócio indígena.

 

Foi Alfredo Brandão em seu trabalho "A Escrita Pré-Histórica do Brasil", o primeiro a aventar a possibilidade de os indígenas brasileiros terem possuído uma escrita própria, ora silábica, ora hieroglífica.

 

O Brasil possui valiosos sítios arqueológicos em seu território, embora nem sempre tenha sabido preservá‑los. Em Minas Gerais, por exemplo, na região que abrange os municípios de Lagoa Santa, Vespasiano, Pedro Leopoldo, Matosinhos e Prudente de Moraes, existiram grutas que traziam, em suas pedras, sinais de uma cultura pré‑histórica no Brasil. Algumas dessas grutas, como a chamada Lapa Vermelha, foram destruídas por fábricas de cimento que se abasteceram do calcário existente em suas entranhas. Além dessas cavernas já destruídas, muitas outras encontram‑se seriamente ameaçadas.

 

 

Quando a evolução humana se processa, a produção artística reflete esta evolução, por isso, que, em face do mundo, o homem cria, o homem vibra, o homem traduz em cores, em riscos, em desenhos, esta vibração interior.

 

Texto pesquisado e desenvolvido por

 

ROSANE VOLPATTO