
ASTROLOTRIA INDÍGENA

Os antigos indígenas do
estado do Maranhão, possuíam uma espécie de sistema astrológico profético que
a história do Brasil, acabou por esquecer. O único que resgatou para a
posteridade tal tradição foi o religioso francês Claude d'Abbeville
que, no século XVI incursionou pelo território que compreende as terras do
atual estado do Maranhão.
Sua
crônica dava pormenores de como alguns astros possuíam significação agoureira
para os ameríndios. Eis uma parte das descrições que d'Abbeville nos legou:
"Há
outra estrela a que os maranhenses chamam Iaouäre, isto é, cão. É muito vermelha
e, ordinariamente, acompanha a Lua de perto, tanto assim que, quando vêem a Lua
deitar-se, dizem que a estrela late em seu encalço, como um cão para devorá-la.
Quando
a Lua permanece muito tempo oculta, durante a estação invernosa, acontece, em
alguns casos, se surge após às chuvas, mostrar-se vermelha que só sangue.
Afirmam então, os maranhenses, que é por causa da estrela Iaouäre. E logo
todos os homens pegam os seus bordões e, voltando-se para a Lua, batem no chão
com toda a força entre mentes, mulheres e crianças gemem, aos gritos e uivos,
voltadas para o céu, depois do que se deitam e rolam na terra, batendo, durante
todo o tempo, com a cabeça e as mãos no solo.

Desejando
saber o motivo desse desatino e dessa diabólica superstição, vim a saber que
os índios pensam morrer quando avistam a Lua assim sanguinolenta, logo que
aparece depois das chuvas. Os homens, portanto, batem no chão em sinal de
alegria e contentamento, porque vão morrer e juntar-se ao Pai Grande".
A
origem deste temor profético está relacionado com o mito que falava do
desaparecimento do Sol, tragado por um grande morcego, seguido da vinda do
"Tigre Celeste" (Jaguar) semelhante a um cão e de cor azulada que se
arremessaria contra os homens para devorá-los. O animal lendário pode ser
identificado com a estrela que traz seu nome, cuja posição junto à Lua
provoca o desespero dos indígenas.

A
cor vermelha da Lua se explica, neste caso, pelo furor do jaguar celeste,
considerada presságio de aniquilamento do Universo e anúncio do fim dos
tempos.
Mito
semelhante possuía os índios Krahós de Goiás. Acreditavam que o planeta Vênus
(Katcheeré) acudia para devolver o brilho do Sol. De forma geral, os indígenas
brasileiros acreditavam que a aparição de Vênus era um sinal de bom agouro,
um prelúdio de esperança, principalmente quando atingia seu brilho máximo
alguns dias do ano.

Uma
outra categoria de astros que anunciava grandes catástrofes é os cometas. Conta-se
que a aparição de um cometa no céu indicava que alguma pessoa próxima ou
parente morreria. Ao contrário de hoje, a passagem de uma estrela cadente pode
vaticinar boas novas para todo aquele, que mentalmente fizer um pedido.
A
Lua, por sua vez, permite adivinhar mudanças de tempo. A Lua nova anuncia
trovejadas, especialmente no mês de outubro. A Lua mais alta no céu, coincide
com a maré alta. Um eclipse lunar pode indicar, como os cometas, infortúnios.
Havia quem acreditasse que olhar para ela durante o fenômeno podia provocar doenças.

Os
índios krahós possuíam muitos mitos interessantes a respeito dos astros. A aparição
do planeta Júpiter nos céus goianos no princípio da noite anunciava a época
da seca. Quando a Lua (Pud'Ieré) passava perto de Júpiter, anunciava que as mulheres
da tribo ficariam menstruadas. Ao aparecer no céu duas estrelas da
constelação da Ursa Maior se prognosticava um casamento iminente.
Mas
o conjunto estelar mais importante era o das Plêiades, também alto do céu, começavam
as chuvas mais fortes.

Os
antigos guaranis, que habitavam a fronteira entre o Brasil e o Paraguai, possuíam
estranhas lendas a respeito dos astros e suas influências sobre os seres humanos.
A nossa tão conhecida constelação do Cruzeiro do Sul apontava para o
"Centro do Mundo", onde vivia o grande deus, Nhandervusu. No dia em
que o eixo da constelação se desvie da sua posição original acontecerá o pior:
um grande cataclismo acabará com todos os seres vivos.
Já
para os nhanaguas, um outro grupo guarani, o Cruzeiro do Sul era Nhandu'i-pó e
representava o rastro deixado por um nhandú ou ema (avestruz) no céu e a sua aparição
nas noites mais claras era bom sinal.
A
Lua nova anunciava o inicio do ciclo menstrual das mulheres e proibia-se as relações
sexuais. Quem se rebelasse contra esta proibição estaria exposta a uma
misteriosa e cruel doença. A aparição das Plêiades no céu da Primavera
assinalava o momento de semear espécies vegetais como melancias.
O
desaparecimento do céu da constelação de Orion (Três Marias) anunciava a
chegada do inverno.
Os
índios de Roraima acreditavam que as Plêiades formam, junto com uma parte da
constelação de Orion, a figura de um homem com uma perna só que subiu ao céu,
depois de sua mulher ter-lhe cortado a outra. Antes de subir, disse ao seu irmão
que, com o seu desaparecimento, começaria as chuvas, e portanto, a abundância
de alimentos.

Verificamos
através de nossos estudos, que a astrolatria constituiu-se em uma etapa própria
dos povos primitivos, tribos sem moradia fixa, que alternavam suas moradias segundo
as estações, caçadas e as colheitas.
Foi observando as estrelas,
que o homem primitivo associou o "Céu Noturno" às variações
metereológicas. Para memorizar certos aspectos, este homem aglomerou-as em
constelações e passou a designá-las com nomes de animais e personagens de sua
mitologia. Passou então a contá-las através de histórias de cunho popular.
Esta tradição oral, chegou
até nossos dias, através de um conjunto de lendas. Em conseqüência deste processo
verbal, uma série de superstições foram adicionadas a estas lendas, com o objetivo
de explicar tudo aquilo que não conseguiam explicar racionalmente.

O homem
primitivo, portanto, recorria às lendas e seus deuses, que tudo explicavam e por
isso, adoravam entidades sobrenaturais que pareciam possuir o poder sobre os
fenômenos naturais.
Assim,
os astros passaram a ser idolatrados como deuses, surgindo a astrolatria, que
serviu de base à astrologia.

Rosane Volpatto
Bibliografia consultada
La
Geographie Humaine - Jean Brunhes. Paris 1942
Primitive
People - Margaret Mead
MAURY (A.),
La magie et l’astrologie dans l’Antiquité et au Moyen Age ou étude sur les
superstitions païennes qui se sont perpétuées jusqu'à nos jours, Paris, 1860
(rééd. Paris, 1970, 426 pp.)
PEUCKERT (W.G.),
L’astrologie. Son histoire, ses doctrines, Paris, 1980
As
Artes Adivinhatórias- Aprender e Conhecer

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