OS ÍNDIOS TEMBÉ

"Nós os índios, sempre cantamos e dançamos nas nossas cantorias, como forma de manter a unidade do nosso povo e a alegria da comunidade. Se a gente cantar e dançar, nós nunca vamos acabar...." (Verônica Tembé - Capitoa da Aldeia Tekohaw)

O CÉU E A NOITE

Nos tempos imemoriais, o ceú estava mais perto da terra do que agora e as nuvens e as estrelas estavam ao alcance da mão. Os passarinhos, desejando voar livremente, resolveram levantá-los um pouco mais. Por isso convocaram uma reunião, a fim de iniciar o trabalho. O morcego também foi convidado, mas não quis tomar parte na obra, recusando a sua ajuda. O céu foi levantado como os passarinhos queriam mas o morcego, desde então, teve de dormir pendurado pelos pés, de cabeça para baixo.

Os índios Tembé de outros tempos tinham suas malocas em campo aberto. Reinava dia sem fim e eles eram obrigados a dormir no claro. Por isso, desejavam um pouco de escuridão para descansar. Foi quando um velho veio contar-lhes que tinha encontrado dois grandes potes, ao lado dos quais o demônio Azã montava guarda. Estes potes eram pretos e estavam cheios de escuridão. Os Tembé acreditaram que a noite tão ambicionada bem que poderia estar escondida nestes potes. E foram então buscá-la.

Ao se aproximarem já escutavam dentro das vasilhas as vozes das corujas, dos macacos noturnos, do Azã que grita "tati", dos grilos, das rãs do brejo e de outros seres que são companheiros da noite.

Chegando a distância respeitável com alguns flechaços quebraram o pote menor, fugindo às pressas, porque atrás deles vinha a noite com todos seus apavorantes bichos. No interior de suas malocas, aproveitaram a escuridão para dormir, mas tal prazer durou muito pouco. Então decidiram quebrar também o pote maior, com o intuito de garantir uma noite um pouco maior.

Aracuã e Jacupeba incumbiram-se da tarefa. Convidaram também o Urutau, de quem eram cunhados. Toda a passarinhada eram homens naquele tempo. Aconselharam então, o Urutau que corresse bem depressa, mas quando quebraram o pote grande, a noite caiu sobre eles correndo velozmente. Urutau tropeçou em um cipó e tombou, sendo alcançado pela escuridão.

Daí, ter se transformado em ave noturna...

OS ÍNDIOS TEMBÉ

A história dos índios Tembé é de lutas, derrotas e conquistas como todo o povo indígena brasileiro. Um povo que busca seu "Lugar ao Sol", num mundo preconceituoso e politicamente contrário aos seus interesses.

Os Tembé foram descobertos em 1636 por missionários católicos que chegaram às margens do Rio Guamá e fundaram uma freguesia onde hoje existe o município de Ourém.

Quando encontrados, viviam completamente nus, ocultando somente os órgãos genitais com uma tala de cipó. Usavam os cabelos, na frebte, aparados na testa e, atrás, longos e caídos pelas costas, qualquer que fosse o sexo. Eram em geral baixos, reforçados e de cor morena-clara. As mulheres traziam uma tiracolo sobre o ombro direito uma facha de algodão branca ou tinguda de urucum chamada de "tupóy", que possuía uma dup´la serventia: encobriam as partes pudentes e conduzir os filhos.

Já os guerreiros, usavam no braço esquerdo um acolchoadado de algodão, que servia para amortecer o choque produzido pelo arco no momento de desferir uma flechada.

Nos dias de festa, adornavam-se com enfeites de penas, consistindo quase todo na cabeça. Amarravam nesta, oblíquamente, uma testeira de penas amarelas, de cauda de japu, tecidas inferiormente com fios de algodão, a que chamavam "acanicale". No cordão com que atavam o "acanicale" na nuca prendiam uma espécie de babado de penas de cauda de arara vermelha, que caía sobre as costas, a que chamavam "aranipéu". Por cima deste, atavam horizontalmente uma espécie de resplendor com três ou quatro penas de cauda de arara, presas em um tecido de algodão, com penas de papagaio, denominada de "atuáraué". Todos estes enfeites reunidos têm o nome de "nayahy".

Na parte superior do antebraço ligavam uma espécie de pulseira, tendo pendente pela parte interna diversos cordões terminados em borlas de penas de papo de tucano (tenapêcuary-tap}. Já na barriga das penas, amarravam ligas estreitas de cordas chamadas "tetémacuáus e acima dos tornozelos outras ligas com guizos de piquiá, chamados "anáiú".

Quase todos usavam, trazida às costas, e penduradas na pescoço, cornetas ou businas feitas de massaraadiba em duas partes e depois unidas e grudadas com leite da mesma árvore. As penas que as enfeitavam eram grudadas com o mesmo leite. Tinha a forma de corno, com o buraco para tocar-se na ponta do lado convexo. Eram cobertas de penas, de papo de tucano, amarelas de arara, vermelhas e de mutum, pretas. Acima do buraco prendia o cordão e um enfeite de penas de gavião real, tecidos com fio de algodão. Esta busina, servia para chmar os companheiros para dança e à guerra e denominava-se "mimé".

As mulheres para festa, ornavam os cabelos com cera virgem e, sem ordem, acrescentavam pequenas borlas de papos de tucano, chamados "uêçauê". Cobriam os braços com penugem branca de gavião real, presa ao breu com que se untavam. A este enfeite davam o nome de "uiráaua". Pintavam também as pernas com urucum e jenipapo.

TUCANAÍRA

Era uma bebida dos Tembé, preparada com mel de pau, saburá dos favos e água. Depois de todos estes ingredientes dissolvidos, eram postos ao sol, durante alguns dias para que fermentassem, sendo em seguida coado e guardado em vaso de barro revestido por uma rede de malhas de fio de algodão e dependurado no teto da casa por meio de um suspensório.

A FESTA DA TUCANAÍRA (descrita por Lima Figueiredo)

Eram dezenove horas...

O som estridente das businas reúne todos, tal qual o toque do clarim no quartel. Somente as mulheres velhas ficavam dentro de casa.

Guerreiros, velhos, moços e crianças formam uma linha em frente à casa do chefe da tribo, entoando um canto lúgubre. O coro só é interrompido, quando o chefe sai e com as mãos para o ar resmunga uma cantiga bárbara que é de vez em quando interrompida pelo estribilho de todos.

Aproveitam esta música então, para a dança. Os convivas descrevem dois círculos consecutivos tendo o chefe por centro. À medida que vão cantando, o círculo ora gira para a esquerda, ora para a direita. Todos batem forte os pés e a roda continua oscilante. O chefe entoa cantos que é respondido pelo coro com: gê-gê-gê.

De repente a cantoria para, a fim de que as mulheres que haviam ficado dentro de casa cantem. Aproveitam essa ocasião para beber tucanaíra, que é servida em uma cuia e passada de mão em mão. Os homens dançam com seus arcos e alternados com as moças.

Esta festa tinha o nome de "penêc".

Dos antigos ritos descritos na década de 1940 (como o acima), os Tembé guardam somente o Wiraohavo, o rito de puberdade dos rapazes e moças, que fazia parte da festa do milho e o Wiraohavo-i (i significa diminutivo), que é um rito com menor duração e mais simplificado, destinado a evitar que aa crianças adoeçam com a introdução da carne na sua dieta.

Os Tembé incorporaram alguns dias santos e o batizado critão, mas não fizeram do cristianismo sua religião. Em sua mitologia, Maíra éo o principal herói cultural e o seu ciclo-mítico é igual ao dos outros povos Tupi-Guarani. O espírito dos animais (principalmente os pássaros), aos quais os índios chamam de piwara, são os responsáveis por suas regras alimentares, observadas particularmente durante os períodos de puberdade, gestação e primeira infância.

É o pajé o responsável em domesticar estes espíritos, que o faz por intermédio de cantos, associados com o uso de seus charutos e maracás. Remédios feitos com plantas, penas, ossos ou pêlos, são aplicados nos transgressores de regras alimentares.

A FESTA DO MINGAU DA MOÇA

A aldeia Tembé de Ita Putyr realiza a Festa do Mingau da Moça. A festa da Moça marca a tradição cultural dos povos de língua tupi-guarani.

A jovem índia, após a sua primeira menstruação é separada e preparada para participar desta cerimônia, até então ela não pode comer alimentos comuns da culinária indígena (caças do mato preparadas de todas as maneiras). Nos dias que antecedem a cerimônia, as meninas ficam separadas em uma maloca longe dos olhares dos homens da aldeia, comendo apenas mingau, frutas e pequenos peixes.

No dia da cerimônia, a aldeia celebra com festas, danças e muita comida, sendo que a culinária é especial para a ocasião, tendo como seu principal atrativo o muqueado (caças preparadas ao fogo durante três dias, e depois são amassadas pelas índias mais velhas para que o mesmo assuma a consistência de massa). Só então, depois do cerimonial é que as meninas novas podem participar do banquete e considerarem-se como membros integrantes da sociedade indígena.


 

Hoje, os Tembé possuem apenas 846 representantes e habitam as Terras Indígenas do Alto Rio Guamá, Turé-Mariquita, Tembé do Acará-Miri e Urumateua, nas margens dos rios Guamá, Gurupi, Capim e Acará, no nordeste do Pará. Falam a língua do tronco lingüístico Tupi-Guarani.

Os Tembé têm se destacado na mídia por sua incessante luta contra invasores e agressores de suas terras indígenas, rompendo com a visão estreita e preconceituosa, daqueles que previram sua extinção há pelo menos 40 anos atrás.

O canto dos Tembé é singelo e harmonioso e é considerado o mais impotante entre todos os cântigos indígenas brasileiros. Rege espetáculos inesquecíveis, pois mistura as batidas dos maracás, com a marcação forte dos pés, entrelaçando  vozes vigorosas masculinas e suaves cantos femininos. 

É deste modo, que cada um deles reafirma a punjança e firmeza de seu povo, renovando ainda, o orgulho de ser ÍNDIO.

Texto pesquisado e desenvolvido por

Rosane Volpatto