A ORIGEM DO MILHO


Há milhões de anos o milho vem
acompanhando o homem ao longo do tempo.
O milho deve ter surgido em solo
centro-americano há aproximadamente 7000 anos.. Devemos procura-lhe a
origem nos planaltos do México, onde, em tempos pré-colombianos, o precioso
grão rapidamente se espalhou ao norte até a barra de São Lourenço, ao sul
até o Prata e à oeste até o Amazonas. Os astecas, maias e incas, não só dele se
alimentavam, mas tinham também uma relação de cunho religioso.
Até o descobrimento da América,
em 1492, os europeus desconheciam por completo a existência do milho. Quando
Cristóvão Colombo levou algumas sementes para a Europa, em 1493, causou grande
sensação entre os botânicos. Linneus, em sua classificação de gêneros e
espécies, denominou-o de "zea mays", do grego "zeia" (grão, cereal), e em
homenagem a um dos principais povos da América, os maias. Hoje seu consumo
abrange praticamente todas as partes do mundo. E não apenas como alimentação. O
milho serve também de matéria-prima para a fabricação de inúmeros produtos como
óleos, cremes vegetais, bebidas e, por incrível que possa parecer, até
combustíveis.
O milho (Zea mays), parece
ter-se desenvolvido de um gramíneo silvestre (Enchalaena mexicana). Dada a sua
importância para a humanidade, surgiram em diferentes culturas, lendas que
explicam sua origem.

LENDA GUARANI

Em tempos perdidos na noite da
antiguidade, quando viviam os índios muito afastados uns dos outros, cada
família devia por si só cuidar e procurar o sustento na caça ou na pesca.
Dois caçadores, porém viviam
juntos e eram os únicos que ajudavam na caça e repartiam o produto dela entre
si e suas famílias.
Um
dia quando foram pescar, disse um deles:
-
Não seria possível que "Nhandeyara", o Grande Espírito, que manda
nas aves do céu e os animais da terra para nosso alimento e o de nossos filhos,
se dignasse de por sobre a terra outra casta de alimentos que fossem mais
fáceis de colher? Os frutos silvestres têm sua curta estação, a caça e
pesca costumam faltar0nos por vezes e muito mal passaríamos, se as raízes de
umas plantas e os grelos das palmeiras não nos servissem de sustento.
Em
tais conversas passaram horas, pois a pesca não foi muito abundante naquela
ocasião. No dia seguinte cedo, aprontaram-se os dois caçadores seus arcos e
flechas e dirigiram-se ao mato à procura de jacús. Caminharam muito,
detendo-se por vezes para escutar o ruído de uma caça levantada que fugisse.
Porém, a batida não deu resultado melhor que a pesca do dia anterior. As aves
e os quadrúpedes tinham-se retirado para outra região e apenas obtiveram o
indispensável. A escassez fazia-se sentir por toda aquela lua. Uma noite,
conversavam os dois amigos assentados sobre um toro que lhe servia de banco
perto da porta, quando lhes apareceu um valente guerreiro, que saíra da
escuridão todo envolvido em raios de luz.
Aproximando-se
deles, disse que era enviado de Nhandeyara, que tinha escutado sua conversa na
escuridão e que o mandara para proporcionar-lhes o alimento que lhes
faltava. Para este fim devia lutar com cada um, para ver qual deles era o mais
forte, tendo o mais débil de sacrificar-se e ser enterrado perto da cabana. Da
sepultura nasceria uma planta, que daria frutos suficientes para sustentar todo
o tempo as duas famílias e a quantos a cultivassem.
E
imediatamente começou a luta no pátio. O mais fraco era Avaty, este era o nome
de um dos caçadores. Deu-lhe sepultura o amigo sobrevivente, que lamentava a
inevitável separação e o estranho guerreiro, desapareceu na sombra de onde
saíra. Aquele tinha que trabalhar com afinco e demorar-se mais nos bosques e
campos para grangear o alimento indispensável para a sua família e a do amigo.
Em
um dos primeiros dias da primavera foram surpreendidos pela agradável nova de
que no túmulo de Avaty tinha nascido uma formosa planta de muitas folhas verdes
e espigas douradas. Viu então o caçador cumprida a promessa feita pelo
guerreiro e tranqüilizando-se compreendeu a grande sabedoria de Nhandeyara, que
pode sacrificar um homem de bem para o bem de todas as outras criaturas.
Desde
então, chamam os guaranis aquela planta "avaty", em homenagem ao
índio sacrificado e os nativos daquela terra cultivaram com esmero nas suas
pequenas roças o primoroso grão, cuja espiga, ao ser passada de mão em mão,
simboliza a união e afetuosa amizade. Pois nenhum bom índio olvida que a
abundância que proporciona esse admirável alimento, tanto aos homens como aos
animais, provém do sacrifício de uma amigo fiel.

LENDA PARECI
Um grande chefe pareci, dos
primeiros tempos da tribo, Ainotarê, sentindo que a morte se aproximava, chamou
seu filho Kaleitoê e lhe ordenou que o enterrasse no meio da roça assim que
seus dias terminassem.
Avisou, que três dias depois da
inundação, brotaria de sua cova uma planta que algum tempo depois rebentaria
em sementes. Mas avisou para que não comessem e sim, guardassem-na para
replanta, deste modo, ganharia a tribo um recurso precioso.
Assim foi feito e o milho
apareceu entre eles.
Monteiro Lobato aproveitou-se
deste mito de vida e morte e, pelas mãos da personagem Tia Nastácia, fez
nascer o Visconde de Sabugosa, uma espiga de milho filósofa e cientista que
andava e falava como os seres humanos e sabia mais do que qualquer pessoa do
"Sítio do picapau-amarelo".

OUTRAS TRADIÇÕES, OUTRAS
LENDAS....
Existe na América do Norte, uma
variante da Lenda Pareci, recolhida graças as investigações de C. Mathews,
que omitimos para não sermos prolixo.
O milho, base da alimentação
dos antigos habitantes do México e da América Central, ocupa um lugar
importante na sua mitologia e história tradicional.
Suas tradições referem que a
invenção deste cereal, deu-se depois da inundação diluvial da Antiguidade
Americana e que foi efetuada por Quetzalcoatl, ou por seu companheiro Yucateca.
Naquela época os deuses,
desejando encontrar com que acudir a subsistência dos homens, se puseram em
marcha para descobrirem alguma planta. Quetzalcoatl chegou ao fim da estação
da chuva a montanha Paxil, situada nos limites ocidentais da Guatemala e do
estado de Chiapas.
Ali encontrou homens carregados
de feixes de milho. Segundo historiadores, seriam formigas, símbolo da
indústria e do trabalho, as que teriam levado a Quetzalcoatl ao descobrimento
deste cereal tão importante.
Em geral, se atribue o achado do
milho à civilização dos Toltecas, parece porém, que os Olmecas, antes
daqueles, o cultivavam.
O milho no mundo pré-hispânico,
era sustento básico do corpo e também do espírito. A religiosidade dos
astecas estava vinculada de várias maneiras com o milho. Era o emblema da deusa
dos cereais Centeotl. O Deus Tlaloc levava uma haste desta planta na mão.
O caráter
sagrado do milho se encontra a cada passo na liturgia dos antigos mexicanos. Em
setembro, a festa das sacerdotisas da Mãe do Milho, circunstância que os liga
aos peruanos, que também veneram neste mês das mulheres, a deusa Mama Sara.
Esta era a época propicia aos casamentos. Sendo a cultura peruana dominada de
uma astrolatria ou astronomia simbólica, não admira a Mama Sara se encontra
ente as estrelas do céu. Ela corresponde à Constelação de Virgem e é
precisamente em setembro que se acha o Sol neste signo.

OS
ÍNDIOS DA AMÉRICA DO NORTE...

Os
índios do leste da América do Norte, acreditavam que o espírito do milho
tinha se originado do sangue da mulher dos grãos. Nas fórmulas sagradas dos
cheroke, o cereal por vezes é invocado como a "mulher velha" e um dos
seus mitos conta como um caçador viu uma bela mulher sair de um pé de milho.
Os
iroqueses acreditavam que o espírito dos grãos, o espírito das vagens e o
espírito das abóboras eram três irmãs vestidas de folhas que se amavam muito
e gostavam de viver juntas. Essa trindade divina é conhecida pelo nome de
"De-o-ha'-ko", ou seja, "nossa vida". As três pessoas da
trindade não têm nomes individuais e não são nunca mencionadas
separadamente.
Os
índios contavam uma lenda segundo a qual o milho era cultivado com facilidade,
até que o "Maligno", invejoso de seu útil dom concedido ao homem
pelo Grande Espírito, lançou sobre os campos uma praga. E, ainda hoje, quando
o vento faz farfalhar o milho, o índio julga estar ouvindo o espírito do milho
lamentando a fecundidade perdida.
Os mitos
da criação das plantas cultivadas deram um sentido de fundação cósmica ao
nascimento dos cereais e converteram a origem da agricultura em um momento
inaugural da vida civilizada. A agricultura, portanto, foi sinônimo de riqueza
e vida civilizada. Seus símbolos eram a abundância de bens, a suntuosidade de
templos, a magnificência das cidades e o esplendor que irradiava a imagem dos
deuses.
Percebe-se
portanto, o quanto os antigos pré-colombianos tinham toda a razão em sua
adoração pelo milho. Em certo espaço do tempo, o milho não foi somente um
alimento, mas uma forma de ver e encarar o mundo. E, para nós hoje, ele é uma
das maiores riquezas que a natureza já nos ofertou.
Texto
pesquisado e desenvolvido por
Rosane
Volpatto

Barring, Ann y Jules Cashford,
(1993) The Myth of the Goddess. Londres, Penguin Books.
Coe, Michael D. (1973) The Maya Scribe and his World. Nueva York, The Grolier
Club.
Florescano, Enrique (1993) El mito de Quetzalcóatl. México, Fondo de Cultura
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Robicsek, Francis y Donald M. Hales (1981) The Maya Book of the Dead: The
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Charlotesville, University of Virginia Art Museum.
Tabue, Karl (1985) The Classic Maya Maize God: A Reappraisal, Robertson, Merle
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Institute.