O PADRE ANCHIETA -

Jesuíta e escritor espanhol (19/3/1534-9/6/1597).

 

O jesuíta Manuel da Nóbrega exaspera-se.

 

Dispõe de apenas cinco auxiliares para a missão de cristianizar as tribos indígenas, educar os filhos dos colonos e zelar pelo respeito à moral.

 

Precisa de reforços com urgência. Sabe, porém, que o Brasil não desperta o menor interesse da corte numa época em que se vive a "febre das especiarias". Conformado, sem poder exigir muito, roga a seus superiores de Lisboa que lhe enviem quaisquer missionários, nem que sejam "os fracos do engenho" e "doentes do corpo".

 

Chega-lhe em 1553 um espanhol de 19 anos que mais parece uma ruína, pronta à tombar. Vítima de deslocamento na espinha dorsal, o jovem sofre de dores agonizantes, só caminha apoiado sobre um bastão e envolve o tronco em faixas na vã tentativa de disfarçar a corcunda.

 

Seu nome é José de Anchieta.

 

 

Quarenta e cinco anos depois, quando é apanhado pela morte no Espírito Santo, o padre Anchieta deixa atrás de si um enorme legado. Percorrendo a pé e descalço toda a colônia, pacificara tribos revoltosas, fundara São Paulo e Rio de Janeiro, convertera índios, contribuíra para expulsão dos franceses e coordenara o trabalho jesuíta no país.

 

Os ares tropicais lhe haviam devolvido a saúde:

 

-"Ocupo-me em ensinar gramática em três classes diferentes. E, às vezes, estando eu dormindo, me vêm despertar para fazerem-me perguntas. E em tudo isso parece que saro. E assim é, porque em fazendo conta que não estava enfermo, comecei a estar são", escreve aos superiores.

 

Robustecido, o jovem Anchieta atravessa as noites em claro, copiando várias vezes a mesma lição para suprir a inexistência de livros. Dedica-se com afinco ao estudo do tupi, a ponto de compor uma gramática do idioma. Maneja a língua nativa para compor canções, poemas e peças teatrais de cunho sacro, isca infalível para atrair os índios ao catolicismo.

 

 

 

No poeta coexiste o aventureiro. Certa ocasião, ele e Nóbrega viajam até a aldeia de Iperoig para negociar a paz com os tamoios. As discussões se arrastam por meses. Estando os dois na praia, um grupo se aproxima para matá-los. Com os índios no encalço, correm até perder o fôlego. Acabam ajoelhados numa choupana, rezando abraçados. Surpresos com a cena, os agressores recuam. Anchieta aproveita a hesitação para, em altos brados, começar uma pregação em tupi.

 

Um dia, um cacique decide sacrificar Anchieta, culpando-o pela falta de caça. Calmamente, o religioso diz-lhe que volte a olhar as armadilhas. Os índios obedecem e encontram-nas repletas de animais. O jesuíta está salvo. Sete meses depois, a pacificação dos tamoios é finalmente obtida.

 

 

Anchieta retorna a São Vicente. Senta-se e anota, de um jorro só, 4.172 versos dedicados à Virgem. Havia composto o poema em Iperoig, escrevendo na areia com o bastão e agora reproduz de memória.

Conhecido como “o grande pihay” (supremo pajé branco), José de Anchieta nasceu na ilha de Tenerife, no arquipélago das Canárias, em 1534.

Iniciou sua caminhada religiosa com 14 anos, quando foi para o colégio em Coimbra. Sua saúde sempre inspirou cuidados e para evitar tantos padecimentos, seus superiores acharam por bem, enviá-lo para um clima mais ameno: o das Índias brasílicas.

Chegou à Salvador, na Bahia, depois de dois meses de penosa viagem, exatamente em 13 de julho de 1553. Manoel da Nóbrega, vice-provincial da Capitania de São Vicente, onde se encontrava a aldeia de Piratininga, já o aguardava. Ele tinha conhecimento da sua competência em ler e escrever e os jesuítas necessitavam de tradutores e intérpretes para falar a língua dos índios locais.

 

Para chegar ao seu destino, teve que percorrer o "pior caminho do mundo", picadas em meio à Mata Atlântica, trajeto que Anchieta fez muitas vezes à pé. Mas apesar de tanto desconforto, ele admirou-se com a luxuriante beleza da Serra do Mar e escreveu mais tarde um tratado sobre as espécies de animais e vegetais por ele observadas.

Um mês depois de sua chegada, em 25 de janeiro de 1554, foi inaugurado o Colégio jesuíta de Vila de Piratininga, data hoje comemorada como a fundação de São Paulo.

Anchieta só dormia de quatro a cinco horas por noite, subia e descia montanhas, catequizava, batizava e ensinava. Reza uma lenda que argumentava que ele costumava abrigar-se para dormir em uma pedra, conhecida como "cama de Anchieta", em Itanhaém.

 

 Quando morreu, em 9 de julho de 1597, aos 63 anos, na aldeia de Reritiba (hoje Anchieta), no Espírito Santo, por ele fundada, os índios disputaram com os portugueses a honra de carregar seu corpo até a Igreja de São Tiago. O jesuíta acaba beatificado em Junho de 1980 pelo papa João Paulo II.

 


 

Texto pesquisado e desenvolvido por

Rosane Volpatto