PINDORAMA
"Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá."

Gonçalves Dias

As palmeiras não só caracterizam uma
paisagem como tropical, mas por seu aspecto altivo imprimem a fisionomia uma
nota de nobreza. Distinguindo-se das árvores por seu tronco elevado e desprovido
de galhos, forte e elástico e por suas folhas com cuidado trabalhadas e
dispostas na forma de amplos abanadores são elevadas a categoria das princesas
do reino vegetal. É em parte por folhagem que ora parece-se com uma magnífica
coroa e ora com as asas de uma grande ave a voar. E, por seu porte soberbo e
graça esbelta, se insinuam respeito e saudades.
Ao Brasil por sua riqueza destas
nobres árvores deram outrora, o belo nome de "Pindorama", o país das palmas. E o
Canto do Exílio do maior lírico brasileiro não começa pela saudade da terra das
palmeiras? Anda envolvida a palmeira na mais antigas reminiscências que existem
em nosso país.

A mais antiga lenda sobre a palmeira
nos foi transmitida pelo Padre Simões de Vasconcelos. "Diziam os que eram mais
curiosos e de maior experiência que por tradição de seus antepassados correra
sempre, que houvera no mundo um dilúvio universal em que morreram os homens
todos e que dos poucos que dele escaparam se tornara a povoar a terra, e foram
estes os primeiros seus progenitores, depois daquele grande dilúvio.
E contavam a história da seguinte
maneira: que antes de chegar o dilúvio havia um homem de grande saber, a que
eles chamavam de "Pajé" (significando feiticeiro, adivinho, xamã), o qual tinha
por nome Tamandaré e que seu grande Tupá (Nhanderú, o avó mais antigo), que quer
dizer Ser Supremo, falava com este e lhe descobria seus segredos. Em um de seus
comunicados lhe foi confiado o saber de uma inundação na terra, que seria
causada pelas águas derramadas dos céus, vindo a alagar o mundo, sem que
sobrasse um só monte ou uma só árvore.

Acrescentou que seu Deus, que de
tudo, ficaria a salvo, uma única palmeira, de grande altura, que encontra-se
fixa ao pé da Mãe Terra em um determinado cume e junto a ela, abençoaria com a
vida uma única família. De posse destas informações o Pajé tratou logo de
transferir toda a sua família para o tal cume, que lhe concederia o benefício da
salvação. Eis que estando ele já assentado, iniciou-se uma chuva que não tinha
mais fim. A água ia crescendo de tal forma, que pouco a pouco foi cobrindo o
monte e ele e sua gente subiram na palmeira e permaneceram nela todo tempo que
durou o dilúvio, sustentando-se com seus frutos, o qual acabado, desceram e
tornaram a povoar a terra.

Outra lenda que encanta é a do Noé
Venezuelano, cuja conservação desta, deve-se ao célebre missionário Pe. Gilli,
que viveu muito tempo nas regiões do Orinoco.
Amalivaca, o Pai dos índios
Tamanacos, isto é, Criador do gênero humano, chegou certo dia, em uma canoa na
época da grande enchente que chamava-se a "Idade das Águas", quando as vagas do
oceano jogavam o país contra as montanhas da Encaramada. Quando lhes perguntou o
missionário aos Tamanacos, como pode o homem sobreviver a semelhante catástrofe,
os índios lhe responderam prontamente: que todos os Tamanacos se afogaram, com
exceção de um homem e uma mulher que se refugiaram no cume de uma elevada
montanha de Tamacu, perto da margem do rio Asiveru, chamado pelos espanhóis de
Cuchúvero e que dali ambos começaram a atirar sobre suas cabeças e para trás os
frutos da palmeira "bariti" e que das sementes desta, saíram os homens e
mulheres que atualmente povoam a terra.

Tendo organizado divinamente o
Orinoco, Amalivaca embarcou em sua canoa e regressou a oposta margem, de onde
inicialmente teria saído. O índios não mais viram desde então chegar a suas
terras homem algum que lhes desse notícias do seu deus regenerador, senão os
missionários e ficaram imaginando que a outra margem era a Europa.
Certa vez, um dos caciques perguntou
ao Pe. Gilli se ele não tinha visto no lugar onde tinha vindo o grande Amalivaca,
o Pai dos Tamanacos, que cobrira as rochas de figuras simbólicas.
Não foi Amalivaca uma criação
mítica, senão um homem histórico, o primeiro civilizador da Venezuela, que
deixou seu nome perpetuado na memória de milhares de gerações. Este mito
encontra-se arquivado nos antigos livros da Venezuela, sob o título de "Lenda de
Moriche", ou "Lenda do Burity", a bela palmeira que ainda hoje inculca a
existência de um povo que desapareceu e nos deixou seu nome e os rastos de suas
conquistas.

Há também uma outra famosa
palmeira, capaz de sustentar famílias ou tribos inteiras e que pode se elevar a
altura de 32 metros. A carne e o âmago de seus frutos são comestíveis, do suco
residente nos invólucros das flores prepara-se o vinho de palma e das folhas
fabricam-se redes.
No sul é conhecido como palmito tucum (bactris) ou piaçaba (attalea funífera)
de cujas fibras duríssimas dá para se fazer cordas, amarras e vassouras.
A palmeira Euterpe ou açaí,
no vale do Amazonas e particularmente nos arredores de Belém do Pará que
pelo seu belo aspecto enleva como a musa Euterpe por suas harmonias, atinge
a respeitável altura de até 48 metros.

Açaí era o alimento básico
das populações ribeirinhas da Amazônia, que depois foi ganhando terreno nas
demais regiões brasileiras, em função de suas qualidades nutritivas.
Verdadeira instituição cultural no Pará, o vinho açaí, caldo obtido com a
maceração da poupa da fruta e que possui uma tonalidade sangüínea perfeita,
está presente nos costumes e nas manifestações musicais e artísticas da
população. Seu indefinível sabor, o gosto todo especial, inédito, deste
excelente vinho, tem também inspirado poetas e pintores que em suas
estrofes, telas ou cantigas procuram eternizar um dos seus aspectos, um dos
hábitos mais originais e encantadores do Norte. E a tradição popular a todos
sobrepuja nas simples e vitoriosa apologia do Açaí, emprestando-lhe
misteriosos e poderosos sortilégios, feitiços irresistíveis:
"Quem vai ao Pará, parou!
Tomou açaí, ficou!"
Este vinho, que possui notáveis
qualidades nutritivas, é o indefectível remate das refeições paraenses. É
interessantíssimo o costume e tudo o que com ele se relaciona apresenta
sedutoras perspectivas.


O Maranhão também é conhecido
como a terra das palmeiras e a mais importante é o babaçu. Uma das riquezas
do Estado, apelidada de "a mina vegetal de ouro".
O babaçu cobre os terrenos
ondulados da baixada maranhense. A quebra do coco é feita por um processo
manual e geralmente realizado por mulheres. É um trabalho delicado que exige
que as amêndoas saem perfeitas, em virtude às grandes distâncias que deve
percorrer até chegar ao consumidor. O ideal é ser industrializada nos
próprios babuçais, onde se faz a coleta.

O óleo retirado do babaçu é
usado na alimentação, na fabricação de margarina, sabonetes e motores.
Já a carnaúba, é uma palmeira de
muitos usos, dá ao homem a cera, a madeira e a palha.
As palmeiras
servem de telhado a remédio e foram largamente usada pelos índios. A indaiá
faz óleo comestível e o babaçu é a maior fonte mundial de sementes
silvestres. A mumbaca que aparece no Amapá e na Colômbia, é queimada pelos
índios para obtenção de sal vegetal. Os índios brasileiros preferem queimar
e pulverizar a raiz da carnaúba para conseguir o sal e garantem que esse pó
é remédio eficaz contra reumatismo.

Olavo Bilac, amante das
palmeiras dedicou-lhes extenso e poético artigo:
"Ela é rainha! Para ela o
primeiro beijo do Sol, quando todos os canteiros e todas as moitas, em baixo,
ainda estão cheias de sombra; para ela o primeiro raio de prata da Lua; para ela
a primeira carícia das asas dos pássaros, que a madrugada acorda; quando
anoitece, quando a treva pesa sobre a face dos lagos, ainda o seu cocar está lá
em cima recebendo o adeus da luz derradeira; e é ela, alta noite, no silêncio e
no recolhimento da natureza, quem mais de perto fita o formigueiro esplêndido da
Via Láctea...."
RAZÃO PARA TANTA POESIA?

A resposta está na história,
onde hoje, somos todos nós os principais personagens. E a terra? É esta
mesma, cujo nome de batismo já foi Pindorama e hoje esta terra mística toma
o nome de Brasil.
Texto pesquisado e
desenvolvido por
ROSANE VOLPATTO


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