
A MÃE MUIRAQUITÃ

Antes das Festas do Amor, as índias
faziam uma jornada expiatória ao lago do Espelho da Lua
(Yacy-Uaruá ), tão belo quanto misterioso e oculto da
profanação dos homens pela mais ínvia e mais brutescas das
regiões alpestres do nosso continente, na grande ilha, que é a
maior do mundo formada pelo Orenoco, o rio Negro e o Amazonas.
Neste recanto mágico, no começo do
mundo, foi morada feliz da gloriosa Jaci, nossa lua venusta, mãe
dos claros lagos e enfermeira dos corações doentes.
Reunidas em torno do Lago Sagrado, as
Icamiabas, nas noites certas fases lunares, provavelmente na Lua
Cheia ou Quarto Crescente celebravam a festa do Jaci, a deusa da
Lua, a mãe querida e temerosa das filhas selvagens.
Subiam então, aos céus, no meio da
imensidade do sertão amazônico, através dos cantos, que nenhum
o de homem pode ouvir, nem jamais ouvirá.
O óleo balsâmico do umiri e fina
essência do molongó alcançavam os ares como uma oblação
aromal à deusa das noites serenas, que tece cuidadosamente com
seus raios de prata os filtros misteriosos os invisíveis amores e
as germinações.
Maceradas de longas vigílias e de
flagelações, as filhas de Jaci, caíam em êxtase antes de obter
a purificação suprema das águas cristalinas do Espelho da Lua,
em cujo fundo mora a Mãe dos Muiraquitãs.

Quando, as horas mortas, a face da lua
refletia bem clara na superfície polida do seu líquido Espelho,
então as amazonas mergulhavam na águas e recebiam das mãos da
Mãe dos Muiraquitãs as pedras verdes, como penhor da sua
consagração, o presente dessas jóias sagradas. Antes de
expostas ao ar e à luz do sol, dos quais recebiam a sua dureza e
consistência, eram os Muiraquitãs como barro e assim tomavam do
capricho das amazonas que afeiçoavam à sua guisa, as mais
bizarras formas: qual de uma flor, uma rã ou ainda a cabeça de
uma fera.
O Muiraquitã era um amuleto sagrado e
mágico que as Icamiabas presenteavam os homens que anualmente
vinham fecunda-las. Dizem que possuem propriedades terapêuticas e
grande fortuna trás a todo aquele que possuir um desses
singulares amuletos.
Quanto ao significado esotérico de
Muiraquitã, devemos decompor seu nome em vocábulos, para
compreender sua simbologia feminina: Mura = mar, água, Yara –
senhora, deusa, Kitã = flor. Podemos então interpretá-lo como
“A deusa que floriu das águas”.
Esta divindade lunar, considerada a filha
de Jaci (deusa da Lua) era reverenciada pelas mulheres que usavam
uns amuletos mágicos chamados ita-obymbaé, confeccionados com
argila verde, colhida nas noites de Lua Cheia no fundo do lago
sagrado Yacy-Uaruá (“Espelho da Lua”), morada de Muiraquitã.
Estes preciosos amuletos só podiam ser preparados pelas ikanyabas
ou cunhãtay, moças virgens escolhidas desde a infância como
sacerdotisas do culto de Muiraquitã.
Nas noites de Lua Cheia as cunhãtay
devidamente preparadas esperavam que Jaci espalhasse sua luz sobre
a superfície do lago e então mergulhavam à procura da argila
verde. A preparação das virgens incluía jejum, cânticos e sons
especiais (para invocar os poderes mágicos da Lua), além da
mastigação de folhas de jurema, uma árvore sagrada que contém
um tipo de narcótico que facilitava as visões.
Enquanto algumas amazonas mergulhavam, as
outras, ficavam nas margens do lago entoando cânticos rítmicos
ao som dos maracás (chocalhos). Depois de “recebida” a argila
das mãos da própria Muiraquitã, ela era modelada em discos com
formato de animais, deixando um pequeno orifício no centro.
Então todas as amazonas realizavam encantamentos mágicos,
invocando as bênçãos de Muiraquitã e Jaci sobre os amuletos,
até que Guaraci, o deus do Sol, nascia, solidificando a argila
com seus raios.
Estes amuletos, que ficaram
conhecidos com o nome de muiraquitã, tinham cor verde, azul, ou
cor de azeitona, e eram usados como pendentes no pescoço ou na
orelha esquerda das mulheres. Acreditava-se que eles conferiam
proteção material e espiritual, e que podiam ser utilizados para
prever o futuro, em certas noites de Lua Cheia, depois de
submersos na água do mesmo lago e colocados na testa das cunhãs,
invocando-se as bênçãos de Jaci e Muiraquitã.

AS AMAZONAS
A imagem das Amazonas, imagem invertida
do ideal masculino sobre o feminino, nem sempre atuou para manter
as mulheres em sua situação. Sendo o desempenho guerreiro um
papel masculino em toda parte, e também um comportamento em geral
vedado às mulheres, a imagem das Amazonas, operou primeiro para
ampliar as oposições ao comportamento das mulheres dentro e fora
do casamento e segundo para sancionar o motim e a desobediência
políticas de homens e mulheres. A representação da Amazonas na
literatura e iconografia, freqüente nos séculos XVI e XVII, nos
leva a crer que a imagem teria a potencialidade de inspirar em
algumas mulheres a ação e levá-las a refletir sobre suas
possibilidades. Além do mais, a "mulher fora de lugar"
alimentou a fantasia de algumas mulheres reais e pode ter
inspirado ações excepcionais.
Na literatura, relatos e provérbios, a imagem das Amazonas em
vários momentos foi diretamente recuperada e relacionada às
potencialidades femininas, à mulher rebelde, à inversão da
sexualidade , ao poder feminino e até à loucura feminina.
Representar a mulher no poder foi recurso
de reflexão feminina sobre as potencialidades da mulher. O mito
volta periodicamente modificado, alternando-se.
No início do século XVIII, as
especulações sobre as "virtuosas" Amazonas estariam
relacionadas à legitimação ao governo das rainhas européias,
senão também à sugestão da possibilidade de ampliar a
cidadania das mulheres. Pierre Petit e Claude Guyon trataram de
encontrar argumentos plausíveis para explicar sua bravura, bem
como de comprovar a sua existência. Já Poullain de la Barre
usou-as em seus argumentos para a entrada das mulheres na
magistratura, e nos primeiros anos da Revolução Francesa
Condorcet e Olympe de Gouges fizeram um apelo em favor da plena
cidadania das mulheres com argumentos sustentados na
potencialidade feminina-amazona.

Movimentos de mulheres e feministas durante o século XX também
usaram a imagem das Amazonas, instigando à luta pelos direitos
femininos de igualdade e de cidadania.
O que me cabe acrescentar é que vivemos
ainda em um mundo da “Grande Ilusão da Separação”, onde
todos os membros da criação co-existem separadamente entre si
como criaturas autônomas sem ligação com a natureza e seu
ambiente, buscando gratificações por impulsos de poder, sexo e
sobrevivência, em competição com os outros. E, nós mulheres,
portanto, permanecemos alienadas de nossos verdadeiros eus, a
fonte de todo nosso poder, que podemos caracterizar na simbologia
da pedra sagrada, ofertada por nossa Mãe dos Muiraquitãs.
O xamanismo, juntamente com o retorno das
Deusas, faz surgir uma possibilidade de lembrar-nos quem realmente
somos: almas de grande majestade, beleza e poder criativo. Já nos
é possível visualizar novos mitos de nós mesmas, novas maneiras
de nos relacionarmos, novos rituais, sonhos e símbolos, novos
métodos de fazer a paz e de resolver conflitos de forma não
violenta. Já nos é possível definirmos uma nova linguagem e um
novo sentido ético, novos modos de curar e educar e uma nova
ciência baseada na espiritualidade.
A nossa Mãe Muiraquitã, nos implora
para que atuemos em todas as áreas pessoais e planetárias, para
trabalhar criativamente e construtivamente no interesse de nosso
bem-estar comum. Nos informa ainda, que o trabalho que fazemos é
por todas as mulheres e pela própria integridade da vida. A
imaginação criativa da experiência das mulheres é a força que
molda esta nova ordem, cuja mensagem é a nutrição espiritual de
toda a criação. Sem o alimento espiritual o corpo perece.

RITUAL DA MÃE MUIRAQUITÃ (Deve ser
realizado em noite de Lua Cheia)
A Mãe Muiraquitã é uma deusa lunar, e
seus poderes aumentam e diminuem em função das fases da Lua.
Para realização deste ritual prepare
seu altar com uma toalha prata ou branca. Acenda uma vela branca e
ponha-a no centro. Se desejar, tenha um vaso com flores brancas no
altar. Diante da vela, coloque um cálice com água, suco claro ou
vinho branco. Queime um pouco de goma mástica e Artemísia. Vista
branco ou prata. Ponha uma confortável cadeira próxima do altar
e sente-se nela. Se desejar, coloque para tocar uma música
instrumental suave e diga:
Amada Mãe Muiraquitã
Oriente-me para as
opções corretas
Por todas as noites
enluaradas de minha vida
Doce Mãe,
Dê-me a vitória
Guardiã e protetoras das
Amazonas,
Dê-me prosperidade,
Conforte-me, Guia-me
Venha a mim nesta hora
silenciosa
Fortaleça minha fé
Equilibre minha vida.
Feche os olhos e relaxe o
corpo. Inspire e expire por três vezes. Visualize uma mata
fechada, onde irá surgir uma trilha prateada. Siga por ela e
encontará uma clareira, onde encontrará um lago cheio de lírios
d'água. Ao chegar, duas Amazonas irão comprimentá-la e a
conduzirão até a borda do lago. Dirão então, que você deve
mergulhar em suas águas. Não tenha medo, mergulhe fundo e verá
um templo redondo com lados abertos e no seu interior, a Mãe
Muiraquitã lhe aguarda, sentada. Ela sorri e a abraça.
-"Irmã", dirá
ela, "fico feliz que tenha vindo".
A Mãe Muiraquitã
conversará com você sobre seus objetivos espirituais e sobre o
que você conseguiu realizar nesta área até aqui. Ela pode dar
sugestões sobre o que poderia lhe ajudar. Você pode contar-lhe
seus problemas e pedir-lhe conselhos.
Após encerrar a conversa,
ela lhe apanhará pela mão e a conduzirá para fora do lago. Um
grupo de mulheres Amazonas se aproximam para ficar com vocês. Uma
delas lhe alcançará um pote de barro contendo água. Ela o
levará a seus lábios e você deve beber.
Ele se inclina e apanha um
lírio d'água. Com grande solenidade põe flor no alto de sua
cabeça. Você sentirá a flor penetrar em seu corpo. Ela dirá
que a flor ajudará a realinhar os centros sagrados em seu corpo
astral. Você sentirá o muiraquitã operando sua magia espiritual
e se dá conta de um sutil bater de coração ao seu redor. A Mãe
Muiraquitã dirá que este é o ritmo da Lua, uma influência que
qualquer humano poderia ouvir e sentir se quisesse.
Uma outra Amazona traz um
muiraquitã numa corrente. A Mãe o coloca em seu pescoço,
explicando que você está recebendo o símbolo de sua iniciação
Lunar e que agora poderá voltar sempre que desejar. A Mãe
Muiraquitã a beija e mergulha no lago para retornar ao seu
templo. Uma das Amazonas lhe acompanhará pela trilha que a trará
de volta. Agora você deve, bem devagar voltar para o seu corpo
físico. Inspire e expire por três vezes e abra os olhos.
SEJA BEM-VINDA!
Texto pesquisado e
desenvolvido por
Rosane Volpatto
