ÍNDIOS
TICUNAS

Os
Ticunas ou Tucunas, foram exaustivamente estudados por
Curt Nimuendaju, alemão de origem, nascido em Iena, em
1883 e naturalizado barsileiro. E, segundo ele,
"ocupavam o trato da selva dos tributários da margem do
rio Solimões, entre a Ilha Parauté e o baixo curso dos
rios da margem oposta da linha divisória do rio Putumaio
ou Içá. Eles evitavam as margens do Amazonas-Solimões,
temendo os índios Omágua e Cambeba, seus tradicionais
inimigos e dominadores, ocupantes das principais ilhas."
"Quando
estes últimos desapareceram, acrescenta Curt Nimuendaju,
os Ticunas se espalharam pelas ilhas e margens do
Solimões até o paraná Auati."

Este
ambiente era mais favorável à vida dos Ticunas. Grande
quantidade de pescado e caça era encontrado nessa
região. E suas atividades se desdobravam,
periodicamente, na coleta de frutos, de ovos de aves e
de quelônios, de larvas de insetos, de batráquios e de
moluscos, que, além dos produtos de suas roças e
vazantes, lhes entravam na dieta adotada à base da
experiência e da tradição sócio-religiosa da tribo.
Os
Ticunas constituem hoje, a maior nação indígena do
Brasil com aproximadamente 32.000 pessoas. Eles são
encontrados também na Colômbia e no Peru.
No
Brasil, estão localizados no estado do Amazonas, ao
longo do rio Solimões em terras dos municípios de
Benjamin Constant, Tabatinga, São Paulo de Olivença, Amaturá,
Santo Antônio do Içá, Fonte Boa, Anamã e
Beruri.

ORIGEM
DO NOME
Os
Ticunas fabricavam um veneno poderosíssimo, de efeito
mortífero fulminante. Por isso eram respeitados pelos
seus vizinhos.

A
história se repete! Hodiernamente, as nações que possuem
mais poderio de armamentos, são as mais temidas.
Ao
"curare", deram os tapuias o nome de "ticuna", nome este
que passou a designar toda a tribo, do mesmo modo que o
pau-brasil, deu nome ao país em que vivemos.

LÍNGUA FALADA E ORGANIZAÇÃO SOCIAL
Os
Ticunas falam uma língua considerada isolada,
que não mantém semelhança com nenhuma outra
língua indígena. Sua característica principal
é o uso de diferentes alturas na voz,
peculiaridade que a classifica como uma língua
tonal. Os Ticuna estão organizados em clãs, ou
"nações", agrupados em metades, que regulam os
casamentos. Membros de uma metade devem
casar-se com pessoas da metade oposta, e seus
filhos herdam o clã do pai. Numa das metades
agrupam-se os clãs com nomes de aves: mutum,
maguari, arara, japó etc. Na outra metade
estão os clãs que possuem nomes de plantas e
de animais, como o buriti, jenipapo, avaí,
onça, saúva.

LENDA
DA ORIGEM DOS TICUNAS (Colhida por Nimuendaju)
O
Grande chefe NUTAPÁ foi quem deu origem ao povo TICUNA.
Um dia
Nutapá foi ferrado no joelho direito por uma caba
miudinha. Onde a caba ferrou apareceu um tumor.

O
grande chefe mandou ver o que era e se havia bicho. E
viram ali dois meninos e duas meninas fazendo
zarabatanas, flechas e estojos para as mesmas, venenos e
muitas outras coisas, boas e más.
Nutapá
tirou aqueles dois meninos de dentro do tumor. E chamou
os meninos de DJÓI e IPI, e as meninas de MOVACA e
AUCANA.
DJÓI
fabricou então zarabatana e o curare. IPI fabricou o
arco e a flecha. AUCANA fabricou o cesto e a bolsa.
MOVACA fabricou a maqueira e a
peneira. Foram eles que inventaram todos os objetos que os Ticunas usam até
hoje.
Os dois
meninos fizeram-se homens e viviam em companhia de
Nutapá.

Um dia
todos os três foram pelos matos, procurando comida. Djói
e Ipi iam à frente; o velho Nutapá, não os podendo
acompanhar, foi ficando para trás.
Assim,
ao transpor um igarapé, sobre o qual uma árvore servia
de ponte, o velho foi comido por uma onça, porque o
sítio era freqüentado por todos os animais.
Dando
por falta do velho, os dois irmãos voltaram ao lugar da
travessia. Mas não o encontraram e nem a onça.
Djói e
Ipi saíram no rastro do bicho, mas não o encontraram
naquele dia. Voltaram então para a travessia. Alisaram o
tronco, estendido sobre o igarapé, com gosma de peixe e
de frutas.

E,
enquanto esperavam, foram fazendo piranhas: pretas,
vermelhas, brancas, apontando-lhes os dentes como haviam
apontado os próprios.
A onça
veio fazer a travessia por cima do tronco, escorregou e
caiu na água, onde as piranhas a mataram.
Djói e
Ipi, depressa, secaram o igarapé, tiraram o couro da
onça e recolheram do seu bucho os ossos de Nutapá,
levando-os para casa. Ali fizeram o velho ressuscitar.
"Nós,
Ticuna, descendemos do velho NUTAPÁ".

A FESTA
DA MOÇA NOVA

A Festa
da Moça Nova, ou seja, da menina que se torna mulher
(após primeira menstruação), é o "Baile de Debutante
Indígena".
Os
ticunas consideram a puberdade um período muito
perigoso, onde os jovens, se não forem bem orientados,
podem ser influenciados por espíritos maléficos. Este
ritual tem a finalidade de iniciar a menina-moça à vida
adulta.
A
partir da primeira menstruação, toda a menina é
conduzida para um local reservado, construído para este
fim com esteiras ou cortinados, onde permanecerá, como
se estivesse em um casulo, durante três meses.
Longe dos olhos do mundo e em total silêncio, a jovem
estabelecerá contato apenas com a mãe e com a tia
paterna e sairá raramente. Durante este período, a
indiazinha deverá dedicar-se ao aprendizado dos afazeres
femininos, como a fiação do algodão e o preparo de
cestas, redes e esteiras.
O
"casulo" é uma referência à borboleta em crisálida. A
jovem, como a borboleta, quando sair de sua reclusão
após três meses, será
reintegrada na comunidade como "moça-nova", ou
seja, uma mulher adulta, que estará apta para casar e
tornar-se um membro ativo da comunidade.
Este
ritual de passagem é realizado anualmente e os preparativos para tão
grandiosa festa, demora vários dias. Prepara-se
trombetas, tambores, várias máscaras que representam
macacos e enfeites para a menina-virgem.
A mandioca e o peixe são preparados
com antecedência, assim como a bebida "Pajauarú"
(fermentado alcoólico da mandioca).

Um dos
principais personagens desta festa é um monstro que vive
na água. Tem mais de 2 metros de altura. É representado
por uma máscara que tem a cara de uma serpente e a boca
sem dentes. Dizem que este monstro comeu, há tempos,
muitos Ticunas. Foi morto quando encontraram-no em um
buraco. Queimaram muita pimenta e a fumaça o sufocou.
Ao
iniciar-se o ritual, os pais
da moça-nova oferecem comida e bebida para os
convidados. Os participantes dançam ao ritmo dos
tambores, flautas e cantos rituais, todos adornados com
pintura facial, corporal e máscaras.

Depois
de uma determinada hora, alguém anuncia que da mata vem
um demônio. Tal ser é um mascarado de macaco, que salta
no meio dos presentes, fazendo gestos obscenos. Os
índios riem muito, comem e bebem.
Aparece
então outro macaco que ronda o cubículo da jovem virgem,
batendo com o bastão no chão. Mas a virgem é protegida
pelos vigias.
Após
três dias e três noites de festa, danças, bebedeiras, os
pais da moça-nova retiram-na da reclusão. Quando aparece
publicamente, estará com os olhos vendados por uma coroa
de penas. O xamã lhe entregará um tição aceso e ela o
atirará com força contra uma árvore que simboliza o mal,
tornando-se, deste modo, imune a espíritos malignos.

Em
seguida, os tios paternos aproximam-se da moça e
arrancam-lhe tufos de cabelos. Ela senta sobre um tapete
de entrecasca e outras mulheres a depilam. Esta é a fase
mais importante do ritual, pois simboliza a morte da
menina para o renascimento da mulher adulta. É renovada
a sua pintura corporal e recolocada a coroa de penas,
mas agora sem vendar seus olhos.
Ocorre
uma última aparição das máscaras e os tios aproximam-se
da moça-nova para dar-lhe últimos conselhos. Em seguida,
todos despem suas máscaras e as entregam para o pai da
moça.
Continuam a dança, mas agora em procissão para
jogarem-se e banharem-se no rio.

EDUCAÇÃO INDÍGENA
Como
vemos, a educação do índio é compartilhada não só com
seus pais, mas também com todos os membros da clã. Os
jovens adolescentes, não são considerados "aborrecentes",
como no mundo dos brancos. Justamente o contrário, todos
os jovens são muito respeitados e cercados de todo o
cuidado, pois são eles que darão continuidade as
tradições da tribo.

O índio
desde que nasce é amparado e educado para viver em grupo
e em comunidade. Como a cultura não é obtida por herança
biológica, e sim o produto da interação social, os
rituais então, se revestem da maior importância. Ninguém
nasce sabendo, aprende-se por treinamento.
A
vida comunitária, entretanto, não irá reprimir sua
liberdade individual e sua espontaneidade.

TICUNAS
HOJE
Com o
acelerado crescimento urbano, muitas aldeias dos ticunas
já foram favorecidas com o conforto que a tecnologia
oferece. Sendo assim, através do benefício da luz
elétrica, foi provocado grandes alterações no estilo de
vida de nossos indígenas. Com a incidência maciça dos
meios de comunicação ocidentais, como televisão e rádio,
as aldeias se tornaram quase cidades. Mas estas
transformações são considerados demasiadamente rápidas e
ao mesmo tempo muito frustrantes.

Os
índios, com esta nova visão do mundo, passaram a almejar
também um novo estilo de vida, mas a sociedade
brasileira não correspondeu às suas novas exigências. O
resultado disso tudo, foi que nosso índio, acabou sem
expectativas. E, desorientado culturalmente, atirou-se
ao alcoolismo, às drogas e ao suicídio. A degradação
social e familiar, também é conseqüência, desta falta de
coesão cultural.
As
tecnologias de "futuro", tornaram o presente "piorado"
para os índios ticunas.
Como
uma luz no fim do túnel, em 1987 surgiu o Conselho Geral
da Tribo dos Ticunas, um organismo criado para
pressionar o governo brasileiro em defesa da população
ticuna, que tem conseguido notáveis êxitos,
principalmente no que se refere as reivindicações da
demarcação de suas terras.
Texto
pesquisado e desenvolvido por

ROSANE
VOLPATTO
Bibliografia consultada:
Moronguêtá
- Nunes Pereira
Índios do
Brasil - Lima Figueiredo
Primeiros
Povoadores do Brasil - J. F. de Almeida Prado
Arqueologia Brasileira - Theodoro Sampaio

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