~*~XANAS~*~    

XANAS DAS ASTÚRIAS

As Xanas são fadas da água doce que possuem morfologia humana e que habitam as zonas do litoral norte da Espanha, no Principado de Astúrias (habitado desde os tempos imemoriais por astures, povo celta). Vivem em pequenos rios da montanha asturiana, assim como em fontes e grutas. Ao lado, na Cantábria são conhecidas como "Janas".

As Xanas são parentes próximas das fadas irlandesas, escocesas e bretãs. Mas, apesar de serem muito parecidas com as ninfas da mitologia clássica, apresentam uma série de particularidades que as tornam diferentes.

Elas parecem ser uma mescla da Deusa Diana romana com outras Deusas Aquáticas anteriores. São consideradas Guardiãs da Fonte da Eterna Juventude.

A primeira descrição de uma Xana foi de um escritor romântico chamado de Enrique Gil e Carrasco que comenta:

"Dizem que há uma espécie de lindas mulherzinhas de prata que saem pela água das fontes, para secarem suas delicadas roupas à luz da lua ou para pentear seus longos cabelos dourados com pente de ouro. A essas mulherzinhas de pouca estatura, misteriosas e cheias de poder, segundo os montanheses, atendem pelo nome de janas."

A descrição física das Xanas podem ser muito poéticas: aparecem nuas ou cobertas por véus e gases transparentes, seus cabelos são longos e brilhantes, possuindo uma beleza excepcional "tão bonitas e graciosas como um raio de luz ao amanhecer"... Para outros autores, elas são pequenas como os gnomos saxões, vaporosas como a nevoa, lindas e envoltas em prateadas túnicas".

Muitas são as Xanas que vigiam tesouros infinitos, tendo por costume jogar bolas de ouro finamente talhadas, sobre os prados nas manhãs de São João.

Aurélio de Llano prefere descrever as Xanas como uma espécie de ninfas pequeninas (40 cm aproximadamente), de extraordinária beleza, que têm um cabelo comprido, vestem o traje típico do país e são cristãs (diferente das Lamias). No entanto, como as Lamias, habitam cavernas e fontes e penteiam seus cabelos com um pente de ouro. De Llano acrescenta, que algumas delas estão nessa condição devido algum tipo de encantamento.

Segundo diversas lendas, as Xanas vestem roupas brancas ou floreadas e aparecem em grutas ou fontes de água cristalina, rodeadas de tesouros, sendo tudo o que possuem de ouro. Sua paixão preferida é fiar meadas de ouro finíssimo e sem nós, ou dançar em corro com suas companheiras, pulando alegres e contentes enquanto cantam, ato que apaixona os pastores ou todo aquele que as escutem.

O ato de fiar está tão relacionado com as fadas, que deu origem a conhecia expressão "mãos de fadas", aplicada às mulheres que sejam ágeis em trabalhos com agulhas.

Nas localidades de Caratão-Mação e do Sardoal,  acredita o povo que, se deixar na lareira o linho acompanhado de dádivas - pão e vinho - este linho será pelas Xanas fiado, durante a noite.

No Algarve, pronuncia-se "Jãs" ou "Jans", e também se crê que se se colocar um pedaço de linho juntamente com um bolo, ao pé de uma lareira, no dia seguinte o linho estará tão fino como um fio de cabelo.

Além de fiar, as Xanas possuem galinhas que colocam ovos de ouro e muitos calderões onde guardam muitos tesouros, podendo tornar ricas as pessoas que as desencantem.

RAPTO DE CRIANÇAS HUMANAS

Na Espanha há referências de alguns casos de raptos de crianças por parte das xanas. Se sabe que as crianças que deixam as fadas em troca são muito pequenos, magricelos e não crescem de forma normal. Aos vinte anos, possuem uma altura de dez, e com muita sorte, pois são, geralmente, doentes e apresentando aspecto macilento.

O folclorista Aurelio de Llano conta que uma mulher de Alea (Ribadesella), carregando um filho muito pequeno e débil, ia de casa em casa pedindo um pouco de manteiga, dizendo ser para a criança. Quando alguém lhe dava a manteiga, ela comia tudo sem dar nada para o filho. Resultou que a tal mulher não era nada mais do que uma Xana, que sabendo que as camponesas deixavam os filhos entre as árvores ou sobre a grama enquanto trabalhavam no campo, aproveitou para roubar a criança mais bela que viu, deixando o seu no lugar. A mãe a descobriu e a Xana apiedada, lhe devolveu a criança. No inverno seguinte, a Xana e seu filho morreram e os aldeões de Alea os enterraram juntos na gruta em que habitavam.

Há casos em que as mães têm dificuldade em saber se a criança que colocam no berço é o seu ou o da Xana, muito embora os "xaninhos" se diferenciam das outras crianças porque têm o corpo coberto de uma fina película de pêlos. Assim ocorreu em "La Canga", onde uma mãe, suspeitando da troca, não deu de mamar ao xaninho, que também não parava de chorar. Em pouco tempo apareceu a Xana com o filho humano entre os braços, entregando-o a verdadeira mãe em troca do seu.

Para se saber se a criança não é uma xana é necessário colocar uma dúzia de cascas de ovos em uma panela com água e colocá-la no fogão para ferver. Se o bebê não for humano, começará a falar expressões como essas:

-"Que estás preparando mami?"; ou "Estou a quinhentos anos nesse mundo e jamais vi um cozido de cascas de ovo antes de hoje".

Na Escócia pensam que seus crescentes desejos de tocar gaita os delata.

Sabe-se que tais trocas ocorrem, não porque as Xanas não sejam boas mães, muito pelo contrário, elas acreditam que seus filhos se criarão melhor com o leite e os alimentos humanos, preferindo para seu mundo os robustos bebês humanos para que tragam sangue novo ao País das Fadas. Talvez esse comportamento de raptar meninas bebês, poderia explicar muitas lendas sobre "encantadas" que existem por toda Espanha, pois elas se tornaram fadas por mero convívio em seu mundo, tendo entretanto, sua origem, no mundo dos humanos e só poderão voltar à ele através de algum desencantamento.

LUGARES ONDE VIVEM AS XANAS (Espanha)

Podemos citar alguns lugares onde algumas pessoas dizem ser domicílio das Xanas:

Gruta de Cogolla no Monte Naranco (Oviedo)

Gruta do Moru (Colunga)

Gruta do Castelo de Aguilar (Muros de Pravia)

Gruta do Lago (Pola de Leno)

Gruta da Xerra de Píson (Monte Alea)

Gruta da Injana, na Serra del Trave (Ribadedeva)

Fonte da Xana em Aguino (Somiedo)

Desfiladeiro das Xanas (Sto. Adriano-Quirós).

 

 

XANAS RELIGIOSAS

 

Existe uma lenda recolhida por Aurélio de Llano, que serve para demonstrar a religiosidade das Xanas, que as diferencia de outras fadas, como as anjanas cantabras ou as lamias vascas:

 

Uma mulher da paróquia de Cardo, vinha do moinho, carregando um pesado fardo, ao chegar próxima de uma fonte, resolveu se sentar para descansar. Quando se levantou para continuar seu caminho, viu que no olho da fonte, boiava um rosário branco e exclamou:

 

-"Virgem Santíssima! Que rosário mais lindo que seja sobre as águas dessa fonte, vou levá-lo para minha filha!"

 

E, no momento de recolhê-lo, apareceu uma Xana que lhe disse:

 

-"Olha mulher, se me tirares o rosário, como poderei rezar?"

 

A senhora deixou-o então onde ele estava e foi embora envergonhada.

 

Portanto, essa é uma lenda que comprova a associação das Xanas com a religião cristã.

 

 

LENDA - O REI E A XANA

 

Conta uma lenda, que na monarquia asturiana de Mauregato (783 a 788 d. C.), para viver em paz com os muçulmanos, se comprometeu de entregar cem donzelas a cada ano, sempre as mais belas do lugar.

 

Uma vez por ano, os soldados escolhiam as jovens mais bonitas e as levavam à força. Quando chegaram ao povoado de Illés, encontraram uma bela moça, Galinda, que se viu perseguida pelos soldados. Aterrorizada aproximou-se de uma fonte para se esconder deles. Em seguida, escutou uma voz que lhe sussurou:

 

-"Se quiseres ser minha xana, viverás dias felizes".

 

-"E o que faço para tornar-me uma?", perguntou a jovem.

 

-"Beba um pouco de minhas águas e ficará livre de qualquer perigo".

 

A moça obedeceu e passou então a observar como os soldados a procuravam por todos os lados até que se cansaram e regressaram para casa.

Na manhã seguinte, eles retornaram para tentar novamente encontrá-la e tiveram a surpresa de ver que Galinda tinha se transformado em uma linda Xana, que agora penteava seus cabelos na borda da fonte.

 

Os soldados se lançaram sobre ela que, com um simples olhar, os converteu em cordeiros.

 

O rei preocupado, saiu em busca de seus soldados e se encontrou com a Xana.

 

-"Onde estão meus soldados?" ele gritou.

 

-"Que soldados, te referes a esses cordeiros?"

 

O rei se voltou e comprovou como os soldados que também o seguiam haviam se convertido em cordeiros. Assustado com o poder da Xana, lhe suplicou que deixasse livre seus soldados em troca de qualquer pedido seu.

 

-"Eu libero teus soldados em troca de teu rompimento com os mouros, para que nenhuma jovem asturiana seja entregue à eles. Se assim não o fizeres, cada vez que um dos soldados tocarem em uma asturiana se converterá em cordeiro, ficando assim, sem teus homens."

 

O rei se comprometeu de romper seu pacto com os muçulmanos e comprovou como o rebanho se converteu novamente em seus obedientes soldados. E, dessa maneira, os asturianos deixaram de temer que os soldados levassem suas filhas, pois sabiam estarem protegidos pela Xana da fonte.

 

XANAS FEITICEIRAS

 

Conta Manuel Llano que alguns povos montanheses de Valderredible, viviam com estranhas "bruxas", parecedíssimas em tudo com as feiticeiras, mas muito belas que vestiam um tipo de camisola branca e brilhante, enquanto aparentavam estarem sempre muito tristes. Gostavam de sossego e tranqüilidade. Elas eram vistas perto de ruínas, escondidas no bosque e em arroios de água cristalina.

 

Nunca eram vistas ostentando riquezas, andavam descalças e sua única relação com os humanos se limitava a fazer o bem, socorrendo os desvalidos sempre que tinham alguma oportunidade, cubrindo-os com sua capa.

 

Por esse aspecto, é fácil adivinhar que em outros tempos as "Bruxas de Valderredible" foram lindas como as fadas.

As xanas asturianas, como tivemos oportunidade de observar, recebem também o nome de feiticeiras.

 

Essa poesia popular recolhida por Manuel Pidal vem enfatizar o que digo:

 

"Ai, que uma xana feiticeira

lavando está na fonte nobre,

lavando meadas de ouro,

vestida de mil primores."

 

FORMAS PARA DESENCANTAR UMA XANA

 

 

No Mundo das Fadas nos encontramos numa aparente contradição: ou as fadas são genuínas, nascidas de outras fadas, ou são mulheres humanas que, por alguma razão, se converteram em fadas.

 

Há muitas lendas sobre xanas asturianas onde elas são qualificadas da fadas encantadas que se deixam ver, sobretudo, no dia/noite de São João, buscando ansiosamente o desencantamento ( as vezes convertidas em galinhas com ovos de ouro), e para consegui-lo têm que se seguir certos procedimentos.

 

 

1. O FIO INFINITO: Pelo meio da fonte passa-se um fio de linho (de uma meada) e um homem e uma mulher devem desenrolar o novelo até o fim, sem deixar que o fio se rompa.

Têm que ser desenrolado continuamente e caso se parta, a Xana não será desencantada.

 

 

2. OS PÃES: Um jovem deve se apresentar às 12:00 horas em ponto da noite de São João, com doze pãezinhos de quatro bicos ao pé do centro da ponte e se dirá:

 

"Fonte (diga o nome)....toma o pão que trouxe e envia para tua Senhora".

 

Esses pães se converterão em cavalos e farão o resgate, desencantando a Xana.

 

 

3. A SERPENTE: Há muitos desencantamentos relacionados com serpentes. A encantada dirá então:

 

-"Eu te farei rico se me aceitares por três vezes, quando me tornar uma cobra e subir em tua perna. A primeira vez serei comprida, mas fininha e subirei muito suave. A segunda serei mais grossa e subirei mais torpe. E, na terceira e última vez, estarei enorme e chegarei com minha cabeça até seu rosto, porém não deves te assustar".

 

Se homem que está decidido a desencantar a Xana ficar com medo ou sai correndo, ela gritará:

 

-"Covarde! Agora me meteste numa enrascada, pois ficarei mais encantada do que antes".

 

Há um outro ritual no qual o jovem que deseja desencantar uma fada ou xana deve dar sete beijos em uma serpente.

 

 

 4. RAMO DE SALGUEIRO: As Xanas sempre estão acompanhadas de seus fiéis cuélebres, os dragões místicos da tradição asturiana. Na noite de São João elas aproveitam o momento em que dormem os dragões e atarem os homens que passam por ali. Se um deles consegue tocar a xana com uma vara ou ramo verde de salgueiro, a libertará.

 

 

As Xanas são fadas que protegem os amores, mas castigam a infidelidade dos amantes.

 

 

RITUAL

 

Todos os rituais para as Xanas devem ser realizados na Noite de São João.

 

Segundo conta Aurelio de Llano, em Caravia as moças adornam as fontes com ramos e flores, para quando chegar a noite determinada possam colher a "flor da água", depositada na fonte pelas xanas, dançando e cantando os seguintes versos:

 

"Que trilha, minha vida

que traila, traila,

que traila, minha vida

a flor da água".

 

A "flor da água" é uma crença popular, flor que as xanas guardam com avaro afã, nos leva a pensar que na realidade não é outra coisa que os reflexos que se produz na água das fontes ao primeiro raio de luz da manhã.

 

No contexto geral da tradição asturiana a "flor da água" simboliza o amor, a beleza e a saúde, por isso é tão disputada pelas jovens aos primeiros sinais do amanhecer do dia de São João.

 

O ato de "levar a flor da água" consiste em lavar o rosto com a água da fonte assim que os primeiros raios de sol foram refletidos nela. Porém, cada fonte pode ser usada uma única vez, por isso a moça que a utilizou deve deixar um ramo ou galho como sinal que essa fonte não tem mais a "flor da água", pois ela já a utilizou.

 

A flor da água manterá o rosto fresco e jovial o ano todo. Também trará muita sorte e um possível casamento ou maternidade. Essa água apresenta ainda um rosário de propriedades curativas para as pessoas e o gado.

 

Também é tradição aproveitar as propriedades curativas do prodigioso rocio. O rito pode consistir em caminhar descalço pelos prados na manhã sãojuaneira, para que se possa garantir proteção contra todo o tipo de enfermidades.

 

A associação de belas mulheres com paragens onde brota a água, nos remonta à crença das ninfas da mitologia clássica.

 

MITO SOLAR

O cabelo loiro e o pente dourado das Xanas, refletem claramente um mito solar. Ainda, por esse motivo, elas apresentam outra característica: tornar-se visíveis na noite ou na madrugada do dia de São João, 24 de junho, uma data mágica que está associada à memória dos cultos pagãos e à divindade solar, cuja veneração só manifestava-se nas festividades do Solstício de Verão.

Essa efemérides assinala o dia mais longo do ano (Hemisfério Norte), que simboliza o triunfo da luz através da plenitude do Sol. Por isso, na festa de São João o fogo adquire um notório protagonismo, com o salto de homens e mulheres por cima das fogueiras.

Na tradição popular, tanto a noite de São João como o amanhecer desse dia gozam de uma magia especial. Estamos aqui, diante da pervivência de antigos ritos pagãos, mas que o Cristianismo se apropriou, fazendo que um santo o presida.

No entanto, a memória ancestral do mito original persistiu, como se vê nos grandes temas dessa festividade: predizer se as moças encontrarão marido, imersão na água como forma de purificação ou renovação, ou a cura de enfermidades com ramos de figueira, entre muitos outros.

Esses antigos gestos rituais, perpetuados como costume do povo e tolerados pela igreja, expressam a memória de velhas crenças pagãs sobre fórmulas para conseguir a fertilidade, a procriação, a proteção frente à forças hostis e a saúde, no marco de uma exaltação do Astro Rei como fonte de regeneração da vida.

De modo, que temos, um antigo legado que foi transmitido em forma de costume ou lenda, para que nunca nos esqueçamos do nosso vínculo com a Magna Mater, a Mãe Ancestral que a tudo procede, sem a qual não podemos encontrar o equilíbrio que tão imprescindível resulta para a evolução da Humanidade.

 

 

Texto pesquisado e desenvolvido por

 

ROSANE VOLPATTO